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A perda de dona Cleo

07/02/2023

O falecimento da professora Cleonice Berardinelli, aos 106 anos de idade, foi uma perda muito sentida pela Academia Brasileira de Letras. Sobretudo porque ela representava uma atenção toda especial com a língua portuguesa, que  prezava acima de tudo.

Dona Cleo, como era conhecida, lecionou na Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro e na Universidade de São Paulo. Nessas duas instituições notabilizou-se pelo domínio extraordinário da vida e da obra do escritor e poeta Fernando Pessoa. Lembro bem de um trabalho do acadêmico José Paulo Cavalcanti sobre Pessoa, examinado e muito elogiado por Dona Cleo. Certamente isso ajudou  muito quando ele se candidatou à Casa de Machado de Assis.

Considerada uma das maiores especialistas do mundo em literatura portuguesa, Dona Cleo lecionou por mais de 50 aos na Faculdade Nacional de Filosofia, sendo autora de obras magistrais como “Antologia de Teatro de Gil Vicente”(1971), “Fernando Pessoa, Obras em Prosa” (1975 e “Sonetos de Camões”, de 1980, todas muito bem sucedidas.

Ela sucedeu na ABL outra grande figura da língua  portuguesa , que foi o escritor mineiro Antônio Olinto, um dos diretores do tradicional “Jornal de Letras”. Deve-se registrar que ela foi homenageada no cinema com o documentário “O vento lá fora”, em que apareceu ao lado da Cantora Maria Betânia, lendo sobre a obra de Fernando Pessoa.

Dona Cleo, no Rio, fez todos os cursos teóricos e se diplomou sob a orientação do maestro Oscar Lorenzo Fernandez, que foi seu professor de piano. Já aos 98 anos de idade ela recebeu o Prêmio Faz Diferença de “O Globo” na categoria prosa. Como se pode perceber, a doutora Cleonice Berardinelli foi uma figura de múltiplas qualidades, daí a admiração por ela granjeada. Trabalhou com grandes mestres da nossa literatura, como Fidelino de  Figueiredo, em São Paulo, e depois Thiers Martins Moreira, no Rio de Janeiro. Em todos esses mestres deixou impressões indeléveis. A cultura brasileira ficou muito a dever a ela.