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Relaxe e goze
Há os costumes. Muita gente sente-se desconfortável se der um passo foradeles. Até pouco tempo, havia uma delegacia de polícia especializadachamada delegacia de costumes. A margem de manobra era menor, e odelegado, necessariamente homem, era o vigilante moral mais ativo.
Mesmo nos dias de hoje, as sentenças pomposas dos juízes, ou, tristemente,de juízas pudorento\as costumam apelar aos bons costumes. Como o mundo évário, e os costumes são muitos, eu nunca entendi como se sabe exatamentequais seriam os bons e quais seriam os maus.
Se forem procurados fundamentos ideológicos, ou filosóficos, não se acharãoconsensos universais, ou mesmo nacionais; aliás, nem pessoais. Então, quempode mais impõe os costumes que lhe são convenientes aos outros, seja opresidente, seja o pastor, seja a mãe, o marido, ou o patrão.
Dizendo de outro modo: como não há uma razão teórica sustentável paradefender o que seriam os bons costumes, a questão é mesmo resolvida noslimites da razão prática. Fica estabelecido que os bons costumes são os meus,e os maus são os dos outros. E estamos combinados.
Estaria tudo bem não fosse o fato de que ninguém combina coisa nenhuma, epouca gente percebe que os costumes podem ser mera armadilha dedominação. As pessoas os cumprem sem pedir conta de suas origens, ou deseu significado, ou, mesmo, de sua utilidade.
Se indagadas a respeito, poderão dar a resposta mais alienada possível: “Ora,porque sim”. Pouca gente suspeita de quem ditou o “porque sim”, muito menosdo conteúdo do “porque sim”. Vou propor um assunto controvertido e pleno de“porque sim”: sexo, ou os costumes sexuais.
Creio que todos estamos de acordo sobre não haver coisa mais pensada,falada e buscada do que sexo. Não há quem não goste, ou não queira sexo. Éespantoso como o mundo se move em torno de sexo. Bem, parece, então,legítimo dizer que além de pensar, falar e buscar, a humanidade gosta egostaria de praticar muito sexo. Muito mais do que se pratica.
Isto entendido, pareceria que tudo estaria resolvido, mas há um outro lado: nãohá nada mais cercado, censurado, vigiado do que sexo. Nem mesmo após osavanços libertários dos anos 1960 a questão foi resolvida; se algun\maspouco\as tomaram mais liberdade, muito\as outro\as se fecharam em umaonda conservadora. Essa onda está por aí.
Para pensar, é interessante saber que o cerco ao sexo é uma tradição semita(leia-se o monoteísmo judaico-cristão-mulçumano). Ou seja, é um costume, sóum costume. Suecos e holandeses não são assim, têm outras práticas, os
indígenas não dão importância ao assunto, os romanos e os gregos tinhamoutro comportamento.
Cada um\a, nos limites do consentimento, que use a cama tanto, como e parao que bem entender, cada um\a que se resolva, gozando ou reprimindo seusdesejos, mas que saiba que mais ou menos liberdade nos afetos é apenasmais ou menos submissão a costumes de uma tradição que, pensando,pensando, não tem muito sentido.
Matutando com referências da moral ainda predominante, confessemos: nóspecamos, pois sexo por prazer é pecado. Bem, pecado é uma concepção deordem religiosa, assim, embora as consciências estejam colonizadas porreligião, ou talvez por isso mesmo, pecado não é o “conceito” adequado paraconsiderar as expressões da sexualidade humana.
Sugiro pensar sociologicamente o conflito: nós mudamos, ou, pelo menos, astantas pessoas que quiseram e puderam mudar, mudaram e não são levadas adelegacias de costume por causa da mudança. Já, ao curtir nosso corpo,buscando nele e no relacionamento com outros corpos os prazeres quepossamos ter, o fazemos livres de amarras morais.
Estamos, em práticas pessoais e em expressões públicas de liberdade sexual,reformando progressivamente os costumes, produzindo transformaçõescivilizatórias que valorizam decisões pessoais. Se alguém for contra, peça-lheum argumento, um só argumento, mas que seja racional. Ou sugira-lhe:namore, relaxe e goze; vai lhe fazer bem.
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