Economia
Situações ‘insinuam movimento de afrouxamento das regras fiscais’, diz TCU
Em sessão do Tribunal de Contas da União (TCU) para julgamento das contas do presidente da República, Jair Bolsonaro, relativas ao exercício financeiro de 2019, o relator das contas, ministro Bruno Dantas, chamou a atenção nesta quarta-feira, 10, para situações que, segundo ele, “insinuam movimento de afrouxamento das regras fiscais”. Para o ministro, esses sinais podem ser “nefastos” para a saúde das contas públicas.
Em seu parecer, Dantas apontou uma série de “dribles” às normas que regem as contas públicas. O voto do relator foi pela aprovação com ressalvas. “O País precisa evitar a todo custo a relativização das regras fiscais, seja sob qual pretexto for. A responsabilidade fiscal dever ser o pilar a ser perseguido não apenas formalmente, mas, sobretudo, materialmente”, alertou.
Como antecipou o Broadcast (sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado), o pagamento de R$ 1,5 bilhão em benefícios previdenciários sem o devido respaldo no Orçamento foi um dos motivos de ressalva às contas. A despesa deveria ter sido executada em 2019, mas acabou virando um “orçamento paralelo” que só foi devidamente registrado no início de 2020.
Na prática, o INSS ficou sem dotação orçamentária, mas continuou executando os pagamentos aos aposentados, pensionistas e outros beneficiários do órgão. A prática fere a Lei de Responsabilidade Fiscal, a Constituição e pode ser considerada crime contra as finanças públicas.
O achado foi considerado especialmente grave porque no fim de 2019 o próprio INSS liberou espaço que detinha no Orçamento para que o governo pudesse atender a outros pedidos de recursos. À época, o próprio INSS ajustou projeções de gastos e liberou, ao todo, R$ 9 bilhões para outros ministérios. As verbas foram remanejadas em seis créditos aprovados pelo Congresso e sancionados por Bolsonaro entre o fim de novembro e o fim de dezembro de 2019, além de uma portaria do Ministério da Economia de 20 de dezembro do ano passado.
Outro R$ 1,2 bilhão para pagamento a organismos internacionais ficou sem respaldo no Orçamento. O Ministério da Economia tinha dotação de R$ 2,3 bilhões, mas quitou R$ 680 milhões que já estavam irregulares desde anos anteriores (ou seja, sem respaldo no Orçamento) e ainda assumiu novas obrigações de R$ 2,9 bilhões.
“Para além da violação a dispositivo constitucional, a assunção de compromissos sem autorização orçamentária configura descumprimento da autorização legal para realização de despesas. No limite, o Poder Executivo estaria extrapolando a competência do Parlamento de autorizar dispêndios governamentais”, disse Dantas, classificando a prática de “rolagem irregular” de obrigações.
O relator das contas chamou atenção ainda para a instituição de R$ 182,86 milhões em renúncias tributárias de forma irregular em 2019. Segundo ele, não foram cumpridos os requisitos de compensação exigidos pela Constituição e pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
Outra irregularidade apontada no parecer foi a capitalização da Emgepron, estatal militar criada para financiar a construção de corvetas e navios para a Marinha. Segundo Dantas, o aporte de R$ 7,6 bilhões na empresa foi feito apenas para “formar caixa” na estatal e destravar a despesa para a construção das embarcações.
Se o gasto com as corvetas fosse feito pela Marinha, ele esbarraria no teto de gastos, mecanismo que limita o avanço das despesas à inflação. Já a capitalização de estatal fica fora desse teto.
“A atipicidade do procedimento revela que a modelagem adotada configurou medida de escape ao teto de gastos, visando à execução de despesas públicas por meio de empresa estatal em favor de órgão da administração direta”, disse o relator.
Ele alertou ainda que, se esse expediente virar corriqueiro, o teto será ineficaz, e o “escape” poderia significar quebra do compromisso do País com o equilíbrio das contas públicas.
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