Brasil
Quem é e o que pensa Nelson Teich, o novo ministro da Saúde
Em meio à pandemia da doença respiratória covid-19, o presidente Jair Bolsonaro nomeou nesta quinta-feira (16/04) o médico Nelson Teich como novo ministro da Saúde, colocando um ponto final no conflito que se arrastava há semanas entre o Palácio do Planalto e o antecessor na pasta, Luiz Henrique Mandetta(DEM).
A troca foi motivada pelos atritos constantes entre o presidente, que minimiza a gravidade do coronavírus, defende o fim do isolamento social e divulga a cloroquina – ainda em testes – como droga eficaz contra a doença, e Mandetta, que se manteve alinhado ao consenso médico, às recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS) e às práticas adotadas pela maioria dos países do mundo.
Em discurso no Palácio do Planalto nesta quinta-feira, ao lado de Bolsonaro, Teich disse que “existe um alinhamento completo” entre ele e o presidente, mas que dará “sequência” e buscará “agregar” à gestão desenvolvida pelo seu antecessor.
O novo ministro da Saúde se aproximou de Bolsonaro durante a campanha presidencial de 2018, da qual participou como consultor, por indicação de Paulo Guedes, então assessor de Bolsonaro para questões econômicas e hoje ministro da Economia.
Teich, que não é filiado a partido político, chegou a ser cogitado para assumir a pasta no início da gestão Bolsonaro, em janeiro de 2019. À época, porém, o presidente nomeou Mandetta ao posto para fortalecer o seu vínculo com o DEM, partido de Onyx Lorenzoni, apoiador de primeira hora de Bolsonaro, ex-ministro da Casa Civil e atualmente ministro da Cidadania.
O combate à covid-19
Nos últimos 30 dias, Teich publicou três artigos em sua página na plataforma profissional LinkedIn nos quais expressa avaliações sobre a evolução da covid-19, causada pelo coronavírus Sars-Cov-2, no Brasil, e a atuação do governo. Em alguns trechos, o agora ministro demonstra ter posições diversas das do presidente da República.
Teich defende, por exemplo, o isolamento horizontal, no qual a população em geral deve ficar em casa para reduzir a velocidade de disseminação do vírus e não sobrecarregar os sistemas de saúde. Já o presidente vem defendendo o isolamento vertical, no qual apenas cidadãos em grupos de risco, como pessoas acima de 60 anos, seriam isoladas – proposta que, segundo especialistas, teria poucas chances de funcionar.
“A opção pelo isolamento horizontal, onde toda a população que não executa atividades essenciais precisa seguir medidas de distanciamento social, é a melhor estratégia no momento. Além do impacto no cuidado dos pacientes, o isolamento horizontal é uma estratégia que permite ganhar tempo para entender melhor a doença e para implantar medidas que permitam a retomada econômica do país”, escreveu Teich, em 02/04.
O isolamento vertical, segundo ele, “tem fragilidades e não representaria uma solução definitiva para o problema”. “Se deixarmos as pessoas com maior risco de morte pela covid-19 em casa e liberarmos aqueles com menor risco para o trabalho, com o passar do tempo teríamos pessoas assintomáticas transmitindo a doença para as famílias, para as pessoas de alto risco que foram isoladas e ficaram em casa”, escreveu o hoje ministro.
Teich pondera que, idealmente, o isolamento deveria ser “personalizado”, se houver um “conhecimento maior da extensão da doença na população e uma capacidade de rastrear pessoas infectadas e seus contatos”.
Para que esse tipo de isolamento seja aplicado, ele afirma que seria necessário examinar em massa a população para a covid-19, estratégia usada em países como a Alemanha, mas no momento não disponível no Brasil devido à escassez de testes. Além disso, seria importante rastrear e monitorar os infectados, possivelmente com o apoio de operadoras de celular.
No âmbito federal, o próprio Bolsonaro já manifestou resistência a essa ideia, vetando um acordo costurado pelo seu governo com as operadoras de telefonia para implementar esse rastreamento por geolocalização.
Em discurso no Palácio do Planalto nesta quinta-feira (16/04), Teich sinalizou que apostará suas fichas na testagem em massa da população para reduzir a intensidade do isolamento, mas sem mudança “brusca ou radical”. Ele anunciou um “grande programa” de testes envolvendo o SUS, o setor de saúde suplementar e iniciativas do empresariado.
“Tem que fazer um grande programa, definir a melhor forma: como vai fazer a amostra? Que tipo de teste? Para paciente sintomático ou assintomático? Isso vai gerar uma capacidade de entender a doença”, afirmou.
Ainda nesta quinta-feira, o Ministério da Saúde publicou no Diário Oficial da União um chamamento público convidando empresas interessadas a fornecerem 4 milhões de testes para diagnóstico da covid-19, por meio de contratação direta emergencial.
Além disso, em 02/04 Teich defendeu ser necessária a coordenação dos níveis federal, estadual e municipal e dos sistemas de saúde público e privado para enfrentar a pandemia. “Também é fundamental o alinhamento dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário”, escreveu. Essa é uma perspectiva ausente em Bolsonaro até o momento, que tem antagonizado com governadores, prefeitos, o Legislativo e o Judiciário em sua defesa do relaxamento imediato do isolamento social.
Uso da cloroquina
Outro ponto de divergência entre o novo ministro e Bolsonaro é como abordar o uso da cloroquina em pacientes com covid-19. A droga, originalmente usada no tratamento da malária, lúpus e artrite, está sendo testada para auxiliar no combate ao coronavírus, mas faltam estudos científicos conclusivos nesse sentido.
O presidente fez diversas referências à cloroquina como solução para a pandemia, enquanto Mandetta preferia dizer que a droga não era uma “panaceia” e que poderia ter efeitos colaterais graves.
Em entrevista à TV Bandeirantes nesta quinta-feira, Teich também adotou cautela em não apresentar a droga como uma solução para a covid-19 neste momento.
“Toda medicação nova tem que ser testada. A hora que você tiver uma informação clara sobre a eficácia, o benefício, a indicação, isso vai estar disponível para todo mundo. Aí você define. Quando não tem isso, o que você vai ter é opinião, e não orientação”, afirmou.
Saúde versus economia
O novo ministro da Saúde é crítico do que chama de “polarização” entre a saúde e a economia, “como se tivéssemos que fazer escolhas entre pessoas e dinheiro, entre pacientes e empresas”.
No início de abril, ele escreveu que cuidados em saúde, estabilidade econômica, educação e condições sociais são todos fatores que impactam a expectativa e qualidade de vida das pessoas em sociedade, e “precisam ser abordados simultaneamente”.
Em 24/03, ele também escreveu que a crise econômica decorrente da pandemia atingiria de forma mais grave as pessoas mais pobres, mas que seria um erro as classes ricas acharem que ficariam imunes à crise.
A preocupação de Teich em conciliar o combate à pandemia com a busca do equilíbrio econômico é positiva para Bolsonaro, que ressalta sua preocupação com o impacto do isolamento social na economia do país.
A dúvida é se o ritmo de iniciativas do novo ministro para reduzir o isolamento será suficiente para aplacar a vontade do presidente. E como a população avaliará a responsabilidade do governo federal sobre o número de casos e mortes por covid-19 nas próximas semanas decisivas.
Oncologista formado pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Teich tem uma trajetória que conjuga a carreira médica com especializações acadêmicas e iniciativas empresariais.
No âmbito acadêmico, o atual ministro fez MBA em administração de saúde pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e em gestão de negócios pelo Ibmec. No exterior, concluiu um mestrado em economia da saúde pela Universidade de York, na Inglaterra, e começou a cursar em dezembro de 2018, na mesma instituição, um doutorado sobre tema semelhante, ainda não concluído.
Na vida empresarial, Teich foi um dos fundadores, em 1990, das Clínicas Oncológicas Integradas (COI), que sob sua presidência se firmou como empresa relevante no segmento. Segundo o jornal Valor, em 2012 o grupo COI faturou R$ 120 milhões e tinha 3.700 pacientes por mês, dos quais 70% eram conveniados a planos de saúde. Em 2015, o COI foi comprado pelo grupo americano UnitedHealth Group, controlador da Amil. Teich deixou a empresa em maio de 2018.
De setembro de 2019 a janeiro de 2020, Teich informa em seu perfil no LinkedIn ter trabalhado como consultor no Ministério da Saúde, assessorando Denizar Vianna, secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos da pasta. Não há no Diário Oficial da União, porém, referência a uma nomeação formal de Teich para a função.
Antes de trabalhar como assessor de Vianna, ambos já haviam sido sócios na empresa Mdi Instituto de Educação e Pesquisa, aberta em 2009 e fechada em fevereiro de 2019, segundo informou o site Poder 360. Agora, Teich será chefe de Vianna, que mantém o mesmo cargo na pasta.
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