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Milagre em Palmeira
Gigi nasceu em Canafístula, povoado perto de Palmeira dos Índios. Sua mãe sustentava a família com o que plantava em um pequeno sítio, única herança do marido. Todo dia de feira em Palmeira, de madrugada, ela alugava uma camionete para levar sua mercadoria: inhame, macaxeira, laranja e pinha. Gigi não frequentou a escola, ajudava a mãe na plantação, na colheita e na venda. Ela adorava os dias de feira, gostava de ver o movimento do povo na cidade, ficava a ouvir as histórias contadas dos poetas de cordel. Gigi tomou corpo de moça aos 16 anos, vistosa morena, sorridente, alegre, sempre com uma flor no cabelo. Ao chegar à feira era a queridinha dos feirantes. Enquanto sua mãe vendia a mercadoria, Gigi circulava, correndo pela feira com um vestido roto, as pernas apareciam e enchiam os homens de fantasia. Ela era a alegria da feira, conhecia, falava com todos, sempre com um sorriso. Todos os homens desejavam Gigi. Certa tarde de verão, férias escolares, Isidoro, rapaz rico que estudava em Maceió, ao perceber a jovem Gigi, ficou encantado e atraído. Na primeira oportunidade, cheio de enxerimento, conversou com a moça, ela correspondeu. Durante a feira Gigi fugidia entrava pelo fundo do quintal da casa de Isidoro. Ficavam sós, aos beijos e abraços. Até que um dia aconteceu. Foi desvirginada. Na camionete a mãe percebeu a mancha no vestido. Que fazer? No dia seguinte as duas voltaram à Palmeira, bateram na casa de Isidoro. Informaram que a família havia viajado.
Dias depois a mãe foi devidamente indenizada por um pequeno valor pelo cabaço da filha. Gigi se libertou. Jovem, bonita, cheia de hormônio, durante a feira andava aos requebros atiçando os homens, todos queriam Gigi. Entretanto, ela escolhia o parceiro, gostava de homem bonito e cheiroso, não importava a idade. Entrava na mata, estendia o corpo embaixo de uma árvore e fazia amor com o escolhido. Aceitava presente, seja monetário ou uma peça de cetim. No Posto de Saúde se abastecia de anticoncepcionais.
Numa tarde morna, na feira, houve um encontro casual do Coronel Astrogildo com Gigi. Ele ficou fascinado, foi direto ao assunto, convidou-a a visitar um quarto, sempre reservado, em uma pousada. Ela gostou do velho Coronel, nas safadezas de cama e no ajutório. O Coronel Astrogildo, em outro dia, fez proposta de amigação. Botava casa, ela era seria teúda e manteúda, com uma condição: seria somente dele e mais ninguém. Apenas a mãe poderia entrar na casa. Gigi contou a proposta do Coronel, depois de algum pensar, a mãe aceitou. Gigi mudou-se de mala e cuia para uma casa de porta e janela, perto do local da feira. O tempo foi passando e o Coronel se enrabichando pelo rabo de sua menina, como a chamava. Ninguém na cidade tinha coragem de um enxerimento sequer com Gigi, embora ela continuasse provocando com seus requebros e sorrisos.
Todos sabiam da maldade e pontaria do Coronel Astrogildo. Contavam histórias e lendas sobre o Coronel. Diziam que sua primeira morte foi por obrigação do pai, a matar um ladrão de cavalo, colocando dentro do ouvido do miserável, água fervendo. Além do mais, não havia atirador melhor no sertão que o Coronel. Ele colhia manga atirando no talo. A manga caía inteira na sacola do capanga.
Até que um dia apareceu Doquinha Cabral, poeta e trovador. Vendia sua poesia de cordel nas feiras. Conquistador de uma lábia sedutora. O povo arrodeava o poeta quando ele contava histórias de Reis e Rainha e de Lampião. Gigi aproximou-se, encantou-se com Doquinha, amor à primeira vista. Os dois ficaram se encontrando. Certa vez, estavam numa tarde de amor em uma esteira na sala. Não era dia do Coronel. Porém, o destino é caprichoso. Deu saudade no Coronel, ele resolveu cair nos braços da menina. Ao chegar à Palmeira entrou num Bar, tomou uma lapada de cachaça. Tião, o Amarelinho, fuxicou que o cantador, estava com Gigi dentro da casa. Astrogildo levantou-se, conferiu as balas nos dois revólveres, dirigiu-se com andar de vaqueiro à casa de porta e janela. O povaréu ao saber, foi acompanhando o Coronel, queria ver sangue. Um amigo correu pelo lado, conseguiu avisar à Gigi. Doquinha levantou-se, deixou as roupas, nu, disparou pelo quintal em zig-zag como havia aprendido no Exército, ouvindo as balas zunirem perto da cabeça. Conseguiu escafeder-se na Mata da Cafurna. O coronel descarregou as 12 balas no malandro, nenhuma acertou. Esse foi o Milagre de Palmeira dos Índios, ainda hoje contado em verso e prosa nos cordéis das feiras do Nordeste.
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