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O Estatístico

20/01/2019
O Estatístico

Aguinaldo era apaixonado por sua esposa. Quando que ela morreu, ele ficou deprimido, saudoso, e passou a catar mulheres nos bares e inferninhos da cidade. Viciou. Nunca havia traído sua esposa, enquanto viva. Mas depois de viúvo, ele tornou-se um conquistador irrecuperável. Fica eufórico com temporada de turismo. Pela manhã, veste uma bermuda por cima do calção de banho, camisa floral e um par de sandálias modernas. Ele conserva um corpo atlético, bom nadador, apesar da ultrapassagem os 65 anos. Por volta das 11 horas da manhã, ele aparece em algum bom hotel, onde tenha amigos funcionários e muita turista. Senta-se à beira da piscina, pede um uísque, gelo e água mineral, abre um jornal. Bebe devagar, enquanto passa a vista com seus olhos de águia nas turistas que estão ao alcance e escolhe as vítimas para atacar. Ele formou ciência nessa escolha. Geralmente são mulheres maduras, que fazem turismo para divertirem-se, férias da rotina. Mas quando aparece uma oportunidade de uma aventura, não se fazem de rogadas, não perdem a oportunidade de realizarem algumas fantasias inesquecíveis, levantarem a autoestima. Aguinaldo conhece pelo olhar, experiência de um aposentado ocioso, dedicado à causa. Elas ficam em grupos pequenos, duas ou três, levam nas sacolas todos os apetrechos para se queimarem na piscina, nas praias, no sal, no sol de Maceió.

Aguinaldo abre o jornal e fica olhando quem chega e se está acompanhada. Ele é respeitador, foge léguas de mulher casada.

Em torno do meio-dia encosta na escolhida pelo seu olho clínico. Com sua lábia agradável, conversa sempre as amenidades que as pessoas gostam ouvir. Conta histórias da cidade, casos bem humorados de sua vida, de seus amigos, geralmente divertidos. É o primeiro passo da conquista. Aguinaldo gosta de ler, é um homem culto, aproveita sua sabedoria na agradável conversa. Ele tem uma grande virtude, paciência. Entra na roda devagar, sob algum pretexto banal, de repente torna-se íntimo.

Quando adquire confiança e as mulheres estão mais abertas, ele as convida para passeios maravilhosos em alguma praia. As turistas ficam encantadas com passeios pelo litoral norte, litoral sul, as lagoas, a cidade de Marechal Deodoro. Às vezes, o entusiasmado pela mulher, faz ele viaja até a bela e antiga cidade de Penedo às margens do São Francisco. Aguinaldo percebe o nível intelectual de cada uma e a leva para os lugares mais apropriados. À noite convida a turista para dançar em alguma casa de música, ou uma cerveja num barzinho, onde possa contar suas quase inacreditáveis histórias. É um profissional. Quando a mulher é culta, durante a tarde, visita o antigo bairro boêmio de Jaraguá, o Museu do Folclore e outros prédios históricos. Tornou-se um excelente guia. Geralmente, termina a noitada em seu apartamento na praia da Jatiúca. As turistas adoram esse tipo de aventura.

Aguinaldo foi um homem fascinado pela esposa, nunca precisou e nem olhou para outra mulher. Ela morreu em um desastre de automóvel há seis anos, apenas um filho que mora em São Paulo. O viúvo não se apega a nenhuma “namorada”, muda constantemente de parceira. Tem mania de estatística, coisa de velho sem ter o que fazer. Anota num caderninho os nomes e telefones das parceiras, seja turista ou conterrânea. E, ao lado, um número, quantas vezes transou com cada uma.

As turistas são as mais marcantes em suas estatísticas. Ele fica extasiado com a temporada de verão. O sol, a luminosidade, o mar verde azulado e o céu do Nordeste, são afrodisíacos. Dão vontade, dão coragem, para as viajantes desaguarem numa paixão, mesmo fugaz como um rio que passa. Pelas estatísticas do caderninho de Aguinaldo, nos 6 anos de viuvez: 212 mulheres passaram por ele, com a média de 4 transadas por parceira, muitas vezes em mais de um encontro, claro. Totalizando 848 marcas de amor em seus lençóis e alhures. Ele acredita que em 2019 chegará à milésima, feito o Pelé.

Apenas uma vez, não somou sua estatística. Certa noite, retornando ao lar, percebeu uma linda mulher na calçada, imaginou ser de programa e convidou-a ao apartamento. Enquanto ele mexia no computador, a moça foi ao banheiro. Ao sair do banho, ela tirou a toalha e deitou-se na cama em decúbito ventral. Quando Aguinaldo olhou, à meia luz, seu magnífico traseiro, não resistiu, deu um pinote por cima da calipígia. Só descobriu ser um travesti na hora que terminou o serviço. Essa ele não anotou. Anulou.