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Uma agressão à liberdade
Dois membros da Academia Brasileira de Letras figuraram agora com destaque no noticiário de imprensa, por motivos distintos. Antonio Carlos Secchin porque lançou o seu inédito livro de versos “O galo gago” e Ana Maria Machado, consagrada autora infantil, em virtude de uma ação de pais do Colégio Santo Agostinho contra o seu livro “O menino que espiava pra dentro”. A obra foi absurdamente acusada de apologia ao suicídio.
No primeiro caso, a deficiência do galo serviu de pretexto para
um bonito movimento de solidariedade, comandado pelo siri e pelo bicho de goiaba.
Tudo acabou muito bem, como convinha. No segundo (caso), repete-se um movimento
de agressão à liberdade de expressão, como aconteceu em outros momentos com autores como Monteiro Lobato no famoso caso de Tia Nastácia.
Deveríamos estar vacinados contra isso. A literatura infantojuvenil está sendo vítima de patrulhamento ideológico, liderado por pais que querem se meter na chamada liberdade de cátedra, que é um dispositivo constitucional.
No Colégio Santo Agostinho não foi só o caso de Ana Maria Machado. Com o
argumento de que lá se doutrinam crianças com ideologia comunista, alguns pais
pediram, também, que fosse retirado do currículo o livro “Meninos sem pátria”, de Luís
Puntel, editado em 1981, e adotado há muitos anos pela mencionada escola. É um
momento extremamente grave para a cultura brasileira.
O fato foi analisado com toda delicadeza pela Academia Brasileira de Letras, na sua última sessão plenária. Quando uma criança come uma maçã para entrar no mundo poético – e isso vira apologia ao suicídio – devemos pensar até onde está se agredindo a liberdade artística e se prejudica a força da criação. A autora, a editora Global e a Academia Brasileira de Letras não concordam com a interpretação dada pela escola: “A ficção requer interpretação. Não se pode ler tudo ao pé da letra. Agindo assim, teremos que reescrever toda a história da literatura infantojuvenil universal.”
Vejam o exemplo de “A bela adormecida”, que inspirou Walt Disney a produzir um dos mais belos musicais da história do cinema. Aquele beijo que acorda a princesa adormecida não foi, nem poderia ser sido, consentido. Como refazer esse clássico?
Vez por outra, enfrentamos esse tipo de movimento, de natureza racista. Em 2010, nem Monteiro Lobato escapou da decisão equivocada do Conselho Nacional de Educação, proibindo a circulação de “Caçadas de Pedrinho”.
Censurar o maior dos nossos autores, como Monteiro Lobato, é uma agressão à cultura
nacional, como agora se quer fazer também com Ana Maria Machado. Lavro aqui o
meu protesto.
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