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Mário Lima
Nesse mês de outubro de 2018 meu pai faria 110 anos. Eu o amava,
eu o admirava. O general Mário Lima educou os filhos pelo exemplo, por suas
atitudes. Homem de pouco falar, de muito agir, dedicou sua vida à família, aos
amigos e principalmente à sua terra. Foi um homem íntegro, capaz, corajoso;
uma das grandes figuras do século XX das Alagoas.
Iniciou sua vida adulta muito cedo, fez concurso para a Escola Militar de
Realengo. Ao sair aspirante em 1930 foi servir no 5º Regimento de Infantaria
em Lorena, interior de São Paulo. No início de 1932 conseguiu transferência
para o 20º Batalhão de Caçadores em Maceió.
O destino foi cruel, em julho de 1932 rebentou a Revolução Constitucionalista (ou separatista) de São Paulo. O 20º BC foi uma das tropas legalistas designada para lutar contra os revoltosos paulistas. O tenente Mário Lima embarcou como comandante da 1ª Companhia de Fuzileiros do 20º BC no porto de Maceió para combater os paulistas,
combater seus amigos do 5º RI, cujo comandante era destacado revoltoso. A
revolução de 1932 foi o maior genocídio do Brasil, morreram milhares de
brasileiros. Recentemente fiquei com maior orgulho quando li um livro sobre a
Revolução de 1932, o tenente Mário Lima aparece como herói daquela guerra.
Arriscou sua vida no meio do tiroteio arrastando para trincheira um capitão e
um soldado, feridos, no campo de batalha. No livro tem o depoimento de um
soldado do 5º RI que recusou atirar contra a tropa do 20º BC, pois seu ex
chefe, tenente Mário Lima estava naquela tropa. Os paulistas perderam a
guerra. O Vale do Paraíba foi ocupado pelas tropas legalistas, o mais
sangrento campo de batalha, brasileiros contra brasileiros, o tenente Mário
Lima foi designado como “prefeito de ocupação” de toda área, tendo uma
atuação humanitária com os irmãos brasileiros revoltosos que perderam a
guerra. Essas e outras histórias constam no livro dos próprios paulistas, do
historiador Wanderley Gomes Sardinha.
Mário Lima serviu por muitos anos em Maceió. Seu trabalho
extrapolava as atividades militares. Desportista, meteu-se em futebol,
equitação, foi até juiz de históricas partidas de futebol. Quando havia um CRB x
CSA era juiz de fora ou o tenente Mário Lima para apitar, embora ele fosse
notório torcedor do CRB a diretoria do CSA aprovava sua atuação como juiz da
partida. Foi presidente da FAD, do CRB, Fênix. Até recentemente, o campeão
do primeiro turno do campeonato alagoano ganhava a Taça Mário Lima.
Serviu quase toda vida no 20º BC, ele chamava com muito orgulho
de “Meu Batalhão”. Sua vida social dentro da comunidade foi intensa. Quando
coronel comandante do 20º BC, no início dos nos 50, Alagoas passava uma
fase política conturbada, Mário Lima teve uma atuação destemida, evitou um
grande derramamento de sangue, garantiu com a tropa do Exército a eleição.
Foi um homem que soube diferençar exageros. Amenizou a cadeia de muitos
comunistas. Ao se reformar do Exército dedicou-se ao trabalho na Santa Casa,
ao Orfanato São Domingos, na TELASA e tornou-se professor de matemática,
para ajudar a criar os filhos.
No domingo anterior ao carnaval havia o banho de mar à fantasia na
Avenida da Paz. Mário Lima, cedo, preparava dois caldeirões de laco-paco,
batida de maracujá e mel de abelha, para servir aos blocos que visitavam sua
casa. Após o desfile defronte à Fênix, todos os blocos, Vulcão, Bomba
Atômica, Cavaleiro dos Montes, Vou Botar Fora, entre outros, dirigiam-se à nossa casa. Os músicos eram servidos com laco-paco, cerveja, tira-gosto. Em
seguida tocavam frevos rasgados e nós caíamos no passo naquele enorme
terraço. Quando o bloco saía, acompanhávamos até a Avenida, retornando
correndo para pegar outro bloco que já esquentava a garganta. Tornou-se
tradição a visita de blocos durante o banho de mar à fantasia na casa da
Silvério Jorge. Os amigos caíam no passo com muita alegria, não perdiam o
carnaval improvisado.
Hoje, domingo sem festa e sem fantasia, lembro os carnavais passados e
meu velho amigo, meu pai, meu herói, Mário Lima. Ele ainda habita nossas
recordações, nossas mentes e corações. Estaria preocupado com a situação
do país, era um democrata. Semana passada encontrei uma carta que meu pai
enviou em 1956 quando eu cursava a Escola Preparatória de Cadetes do
Exército, me aconselhava: “..Pensa sempre no bem do Brasil. Sirva mesmo
de rumo aos teus atos e ações o pensamento constante na grandeza da
Pátria querida. Porém jamais te cumplicies aos aventureiros da política
malsã que infelizmente ainda infesta o Brasil. Seja sempre digno,
mantenha sempre bem alto o alvo de tuas ambições e afetos; porém
também sempre te lembres que são injustificáveis as “quarteladas” e a
“ditadura”… Guardo essa carta há 62 anos, minha bíblia.
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