Variedades
Interpretação eletrizante da fantasia de Mignone
Quando retornou ao Brasil em 1929, depois de nove anos de estudos em Milão, Francisco Mignone sofreu forte patrulha exercida pelos nacionalistas, capitaneados por Mário de Andrade, que no ano anterior havia publicado seu Ensaio Sobre a Música Brasileira. Capitulou ao nacionalismo. Em carta trazida a público pelo pesquisador Flávio Silva, o compositor escreve o seguinte: “… amparado da cordial e espontânea amizade de Mário de Andrade, embrenhei-me no cipoal da música nacionalista e, também, para não ser considerado (…) uma ‘reverendíssima besta’ (…). Compus, compelido, quatro fantasias brasileiras, para piano e orquestra, Maracatu de Chico Rei, Festa das Igrejas e Sinfonia do Trabalho”. Compelido significa obrigado, forçado, pressionado.
Por isso, entre 1929 e 1936, ele compôs as quatro fantasias brasileiras para piano e orquestra, deliciosos miniconcertos condensados. Mas, ao contrário de outros nacionalistas, Mignone acentuou e praticamente só bebeu nas fontes da música africana e misturou-as com ritmos bem brasileiros. Mário, talvez ironicamente, chamava essa de “a fase negra” do compositor.
É bom saber da origem delas, no momento raro em que a quarta fantasia foi programada, no concerto de quinta-feira, 21, na Sala São Paulo, em execução primorosa do pianista Fábio Martino, acompanhado por uma Osesp especialmente vibrante nas mãos de Neil Thomson. Mignone usa farta percussão, como Villa, mas sua orquestração é mais redonda, menos áspera. E a parte do piano solista é particularmente desafiadora. Ostinatos obsessivos, acordes e brutais clusters (cachos de notas indeterminadas tocadas com as palmas das mãos abertas).
Esta foi, aliás, a noite de mais uma peça raramente programada. Martino também solou a música Peça de Concerto para Piano em Fá Menor, opus 79, de Carl Maria von Weber (1786-1826). É, na prática, o terceiro concerto dele para piano, só que interligados e um programa tão extenso que o próprio Weber resumiu assim: “Allegro, partida; Adagio, lamento; Finale, miséria profunda, consolação, reunião, júbilo”.
Duas reinvenções musicais de uma das mais famosas tragédias de Shakespeare, Romeu e Julieta, complementaram o concerto. De um lado, a “sinfonia dramática” de Berlioz com solistas e coro que, surpreendentemente, coloca na orquestra o par central. Assim, na segunda parte, Romeu só e Festa nos Capuletos, o herói é personificado pelo oboé; a festa final é sinfonicamente opulenta, talvez demais. A abertura-fantasia Romeu e Julieta de Tchaikovski é uma aula magna de orquestração. Consegue, misturando açucaradas melodias com trágicos momentos, retratar de modo impactante a tragédia – tudo regado a dois temas memoráveis que o público sai cantarolando: o do amor e o da tragédia.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Autor: João Marcos Coelho, especial para o Estado
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