Variedades
‘Lua de Júpiter’ retrata o drama dos refugiados e muitos outros tema
Talvez o grande desafio de Lua de Júpiter, o longa do húngaro Kornel Mundruczó que acaba de estrear, seja tornar palpável para todos – o cineasta, o público, o ator que faz o papel – o verdadeiro significado da experiência que atinge o imigrante sírio Aryan. Numa entrevista realizada no ano passado, em Cannes, Mundruczó admitiu que se trata de seu filme mais complexo. “Aborda muita coisa, e não estou muito seguro de que consiga explicar o por quê de tudo. Sob múltiplos aspectos, lancei-me num voo com a mesma perplexidade que você pode flagrar no rosto de Zsombor Jéger (o ator que faz Aryan).”
De cara, ele está tentando entrar ilegalmente na Hungria. Na cena inicial, uma van é detectada pelas forças de segurança e homens, mulheres e crianças iniciam uma fuga desesperada, perseguidos por policiais que usam máscaras e parecem saídos de alguma ficção científica tipo Star Wars. Aryan é atingido por um disparo e levado para um hospital que é tudo, menos um centro humanitário. Corrupção e violência correm soltas, dando conta do estado do mundo. Nesse quadro, e sem que se saiba exatamente o motivo, ele descobre que adquiriu a capacidade de levitar. Mais do que isso: de voar.
O elemento fantástico fez com que, na competição de Cannes, Lua de Júpiter – ainda mais com esse título -, rapidamente fosse rotulado como ficção científica. Não é, pelo menos não no sentido usualmente atribuído ao gênero. Mundruczó está mais para um teólogo do que para autor de fantasias. Embora ainda reduzida – cinco filmes com esse – sua obra inclui uma atualização do mito de Joana DArc (Johanna) e variações sobre o tema do filho pródigo (Delta e Tender Son). Seu filme mais conhecido, no Brasil inclusive, é White Dog, que venceu a mostra Un Certain Regard em Cannes e foi lançado no País como Deus Branco.
Um cão de raça mista. O dono recusa-se a pagar a multa estipulada pelo governo e Hagen, seu nome, é separado da garota Lily, a quem tenta localizar nas ruas de Budapeste. Hagen atrai uma multidão de seguidores mestiços e logo há uma revolta de cães que paralisa (e toma conta) da cidade. Mundruczó utiliza seu cão para retomar a grande revelação do asno Balthazar de A Grande Testemunha, de Robert Bresson, mas ao estilo ascético do autor francês, prefere – e imprime – a violência de Sam Fuller em O Cão Branco, sobre aquele outro cachorro treinado para atacar negros. O cão branco de Mundruczó, porém, busca a transcendência.
É, de certa forma, o tema de Lua de Júpiter. Aryan voa sobre um mundo que parece resumir o estado de crise de 2017/2018 – religião, racismo, milagre, homossexualidade, a crise dos refugiados, o terrorismo islâmico. O filme engloba tudo. Demais, até. O trabalho de câmera do operador Marcell Rev é prodigioso e o ator Jéger mostra que Aryan talvez pertença a uma longa linhagem de santos inocentes que assombra a cultura ocidental.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Autor: Luiz Carlos Merten
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