Variedades

Emissoras da Europa criam consórcio

04/05/2018

Três grandes redes públicas de TV da Europa, France Télévisions, a alemã ZDF e a italiana RAI, anunciaram na quinta-feira, 3, em Lille, na França, a criação de uma “aliança” para investir na produção de séries em solo europeu. O objetivo é melhorar a capacidade de concorrência com gigantes como Netflix, HBO e Amazon e produzir conteúdo de qualidade que possa ser não só transmitido por suas emissoras, mas também revendido a plataformas e TVs de outros países do mundo.

O desafio é enorme. Hoje as emissoras europeias podem investir até € 800 mil por hora de produção audiovisual, enquanto concorrentes privados europeus, como Canal+, chegam a investir € 2,5 milhões por hora de conteúdo. E nenhum dos europeus pode, por enquanto, concorrer com superproduções para TV como Game of Thrones, da HBO, cujo investimento chega a € 10 milhões por hora. Com a aliança, a expectativa é de que as parceiras possam chegar a investir até € 2,5 milhões por hora, melhorando a qualidade de produção das séries financiadas pelas emissoras públicas.

A parceria segue o modelo da Nordvision, a associação de emissoras públicas do norte da Europa. Juntos, os canais DR, da Dinamarca, SVT, da Suécia, NRK, da Noruega, Yle, da Finlândia, e RUV, da Islândia, anunciaram em abril a criação de um consórcio, o Nordic 12, para a produção de 12 séries por ano a serem transmitidas por todos os canais participantes e revendidas no exterior.

Pelo modelo da Europa continental, outras emissoras públicas ainda não participantes poderão fazer parte de projetos pontuais ou ao menos se unir à aliança em médio e longo prazo, casos de RTVE, da Espanha, RTBF e VRT, da Bélgica, e RTS, da Suíça, já considerados “parceiros privilegiados” dos canais fundadores.

Pelo acordo assinado, as emissoras manterão os direitos de propriedade intelectual, o que lhes permitirá revender o conteúdo para exportação. Além disso, participarão da seleção e produção das séries desde o início – e não apenas comprando o direito de transmissão exclusiva, por exemplo. “Juntos, nós teremos a possibilidade, apesar das medidas de economia, de alcançar orçamentos comparáveis ao nível internacional para criar séries de prestígio”, comemorou Thomas Bellut, diretor da ZDF, que vê na iniciativa uma possibilidade de reforçar a identidade cultural dos três países. “Os europeus são os melhores para contar a História e as histórias europeias”, acrescentou.

Segundo Delphine Ernotte, diretora da France Télévision e idealizadora da parceria, três projetos de séries já estão em curso. A mais importante delas é Leonardo, uma produção italiana da RAI, que terá a coprodução de ZDF e France TV, que abordará a vida do gênio Leonardo da Vinci. A previsão de lançamento é 2019, quando se completam os 500 anos da morte do artista e inventor. Outros dois projetos já na fase de produção são Mirage, que com toques de espionagem conta a história de Claire, expatriada francesa em Dubai, que acredita em uma miragem quando descobre, 15 anos após a suposta morte e sob uma nova identidade, o seu ex-marido, que terá a coprodução da plataforma canadense Cineflix, e Eternal City, que será ambientada na Roma da Cinecittà, nos anos 1960, quando a cidade era o centro artístico e político da Europa. O objetivo é ampliar o espaço da ficção de perfil europeu com “histórias locais com alcance universal”, além de ficção científica. “Agora podemos imaginar blockbusters europeus que possam concorrer com as séries americanas”, afirmou a diretora de Ficção da RAI, Eleonora Andreatta.

O mercado do audiovisual na Europa vive um forte momento de transformação, com a expansão rápida dos gigantes americanos – em especial Netflix – e com a entrada de companhias de telecom, como as francesas Orange e Altice, na produção de séries. Na França, uma negociação também está em curso para que o tempo de intervalo entre a exibição de um filme no cinema e sua transmissão nas TVs seja reduzido. A contrapartida exigida pelo governo é de que as companhias americanas e telecoms entrem no sistema público-privado de financiamento da ficção audiovisual – a chamada “exceção francesa”.

Autor: Andrei Netto, correspondente
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