Verão de 1965, cheguei a Maceió, tenente do Exército, bonito e solteiro, férias no meu paraíso, vesti um velho calção de banho desci à praia da Avenida da Paz, mar azul esverdeado, mergulhei, nadei. Durante o almoço Rosita, irmã mais velha, convidou-me para visitar o acampamento de bandeirantes, ela a chefe. Ao entardecer fui ao  Pontal da Barra onde meninas adolescentes se divertiam brincando de bandeirante, logo notei uma lourinha, moça bonita, a beleza de anjo me tocou, tirei-lhe uma graça, cantando, “oh galeguinha você é tão bonitinha, engraçadinha, vou me casar com você…”  O tempo passou, anos depois retorno a encontrar a galeguinha, uma bela mulher, vinte anos, namoramos no carnaval em fevereiro, noivamos em agosto, casamos dia 9 de janeiro de 1970, há exatamente 45 anos.
Durante o curto noivado, nos divertimos comprando móveis, a casa estava garantida na Vila Militar. Tudo era bonito, certa vez compramos um móvel crente ser de primeira qualidade, ao chegar em minha casa, fui obrigado a trocá-lo. Para noivos tudo é belo, inclusive a vida, eu beirando os 30 anos, Vânia, 21, todos os dias nos falávamos, nos víamos entre abraços, beijos, paixão ardente, hormônios ativos. Depois de tanto tempo, ainda beijo seus lindos cabelos que a neve do tempo marcou
Na noite do 8 de janeiro, os amigos foram se achegando sentando à mesa no Bar do Miltinho, o melhor tira-gosto da cidade, cerveja gelada, uísque, cachaça da boa, celebração de meu último dia de homem livre, despedida de solteiro. O Bar do Miltinho ficava na Praça Treze de Maio, um recanto bucólico, arborizado, a melhor área verde do bairro do Poço, onde foi construída a sede do SESC, por que destroem nossa bela cidade? Se eu fosse prefeito, implodia o SESC, retornava a praça, do povo.
Preparei festa para 100 amigos, entretanto, às 8 da noite o bar estava lotado, de repente aparece o Téo Vilela com Banda de Pífano, animou o encontro. Discursos, cantoria, contação de histórias, engraçadas e obscena. Amigos militares junto aos amigos comunistas no auge da ditadura, três raparigas, uma cafetina, sentadas junto a um padre. Alegre despedida de um boêmio. Terminamos o dia amanhecendo cantando em ritmo de guerreiro: “A minha turma que bebe um pouquinho no Bar do Miltinho até o sol raiar…”
Agora, quarenta e cinco anos depois, ainda festejamos a união, a felicidade, algumas desavenças. E Eu fiquei mais velho, quase não senti
A Catedral lotada de convidados, o Capitão no altar, esperando, Vânia atrasou quase uma hora, os amigo brincavam, a noiva fugiu. De repente ela entrou com seu pai, linda, devagar ao som da marcha nupcial, eu tinha os olhos molhados, a imagem em nada mudou, vestida de noiva, sorrindo e querendo chorar.
A cerimônia do casamento foi belíssima. A Banda de Música do 20º Batalhão de Caçadores tocou belas músicas no auge da MPB, da Bossa Nova. O padre Salomão fez uma emocionante oração sobre a união, o casamento. Após a cerimônia saímos de braços dados, do lado de fora da igreja estavam meus colegas oficiais do Exército com suas espadas cruzadas, fazendo um túnel, a abóboda de aço, por onde, juntos, abaixados, atravessamos. Durante a recepção a alegria reinou com uma Banda de Pífano, muito uísque, muitos amigos, está gravada na memória aquela noite, das mais importante e mais felizes de minha vida.
Nesses 45 anos, o céu nem sempre de Brigadeiro, algumas rotas de colisão, alguns percalços, soubemos enfrentar, nenhuma tempestade poderá mais fazer nosso barco afundar, além de tudo, agora já avistamos a praia, estamos pertos, navegar é preciso, é inexorável. Retenho em minha mente, em minhas lembranças nítidas, como de fosse hoje, a imagem, a noiva entrando na Igreja, vestida de noiva, sorrindo, feliz, olhando para mim, que nunca deixei de lhe amar.
Construímos uma vida, uma bela família, três filhos, três netos, Vânia deixa de legado sua atuação na Justiça sempre ao lado do bem social como Promotora, como Advogada e Professora. Também deixo meu legado nos livros, na cidadania por uma sociedade mais justa. Acreditamos no ser humano. Em nossa casa de praia, na parede da sala, está desenhado um verso de meu querido Lêdo Ivo: “Na Barra de São Miguel, diante do mar, só agora compreendi, o dia mais longo de um homem dura menos que um relâmpago.”
Quarenta e cinco anos de luta e prazer, momentos de dor. O coração e o tempo nos faz compreender que a vida é tão pequena, é um relâmpago para se
viver um grande amor.