Um tête-a-tetê com São Pedro clamando por chuva

24/01/2024 19h07 - Atualizado em 24/01/2024 20h08
Um tête-a-tetê com São Pedro clamando por chuva

Sob o sol esturricante, o calor neste janeiro de 2024 é quase insuportável. Por isso, peço vênia e a São Pedro suplico um tête-a-tête para lhe pedir chuva, muita chuva para este Sertão de meu Deus que, tão sofrido e seco, clama por uns minutos de água... mas confesso que o desejo mesmo era que chovesse três dias sem parar, tal qual a antiga marchinha de carnaval.

Neste rincão do mundo, onde a terra racha e o céu parece esquecer de suas lágrimas, os dias de janeiro se arrastam como uma lenta e triste música de despedida. O sol, um astro inclemente, dita o ritmo da vida e do trabalho, enquanto os corações dos sertanejos, resilientes e esperançosos, batem ao compasso de uma eterna espera.

Em cada esquina, em cada olhar, há uma história de resistência. O gado magro, a terra árida, as plantações que clamam por um alívio, compõem o cenário deste Sertão de Deus. As mãos calejadas dos trabalhadores refletem a dureza da terra, mas também a firmeza de quem nunca desiste.

Mas hoje, neste janeiro escaldante, permito-me sonhar. Sonho com a chegada triunfal da chuva, anunciando sua presença com o cheiro de terra molhada, que se espalha pelo ar, trazendo um alento para corações sedentos. Imagino as primeiras gotas, tímidas, quase inseguras, tocando o solo ressecado, seguidas por uma enxurrada generosa, transformando o cenário, trazendo vida onde antes só havia sede.

Sonho com riachos que voltam a correr, com a grama que se torna mais verde, com as flores que desabrocham, como se agradecessem pessoalmente a São Pedro por sua benevolência. As crianças, essas almas livres e leves, correriam pelas ruas, banhando-se na chuva, rindo e cantando, como se celebrassem um antigo ritual de agradecimento aos céus.

Visualizo a transformação do Sertão sob a chuva: riachos reencontrando seus caminhos, a vegetação ressuscitando em tons vibrantes de verde, a alegria espontânea das crianças correndo sob o céu cinzento, suas gargalhadas misturando-se ao som da água. A chuva, generosa e incessante, lavaria a face da terra e das almas, trazendo uma nova esperança, um novo começo.

Por três dias, o sertão dançaria sob a chuva. Três dias de renovação, onde cada gota traria consigo a promessa de um futuro melhor. Os velhos contariam histórias, os jovens fariam planos e as crianças, ah, as crianças, essas entenderiam o verdadeiro significado da palavra esperança.


No quarto dia, quando a chuva finalmente cessasse, deixando para trás poças brilhantes sob o sol nascente, o Sertão não seria mais o mesmo. Estaria mudado, renascido, como se a própria chuva tivesse lavado não apenas a terra, mas também a alma de cada habitante.

E enquanto o sol voltasse a reinar no céu azul, haveria, em cada coração sertanejo, a certeza de que, após cada período de seca, virá a chuva. E com ela, a vida, em seu ciclo eterno de morte e renascimento, nos lembraria que, mesmo nos momentos mais áridos, a esperança nunca deve morrer.