Tic Tac, Tic Tac
Em meio ao gabinete luxuoso da prefeitura, o prefeito que tinha se transformado e ficado deslumbrado ao longo do mandato olhava fixamente desesperado para o grande relógio pendurado na parede. Cada "tic tac" ressoava como um martelo em sua consciência. Estava em seu último ano de mandato, e a sensação de impunidade que o acompanhara durante anos começava a se esvair. Ele sabia que, ao deixar o cargo, não teria mais o escudo político que o protegia das consequências de suas falcatruas.
Durante seus oito anos de governo, o prefeito havia manipulado contratos, desviado verbas e se envolvido em inúmeras corrupções. Agora, com a proximidade das eleições e o fim iminente de seu mandato, ele temia pelo futuro. Afinal, fora um prefeito popular, mas o povo é volúvel, e a justiça, uma vez acordada, pode ser implacável.
Seu plano de emergência era claro: lançar um sucessor de confiança, alguém que pudesse continuar seu legado e, mais importante, manter suas falcatruas sob o tapete. Este sucessor era alguém de extrema confiança e de longa data. Ele confiava que esse sucessor manteria os esqueletos bem guardados no armário.
As semanas que antecederam o anúncio do sucessor como candidato foram de intensa preparação. O prefeito investiu pesado na imagem do sucessor, retratando-o como o continuador de um governo de sucesso. Nas propagandas, o sucessor era gente do povo, administrador eficiente, guardião das conquistas da era do prefeito. Mas ele sabia que a maquiagem midiática era apenas uma camada fina sobre a realidade corrupta de sua gestão.
No entanto, havia algo que o prefeito não previra: a resistência crescente da população. As redes sociais fervilhavam com acusações e investigações feitas por cidadãos e jornalistas independentes, que exigiam transparência e justiça. Grupos sindicais organizavam protestos pressionando por direitos. O prefeito sentia que o controle estava escapando de suas mãos.
E então veio o golpe de misericórdia: uma série de documentos vazados revelou o verdadeiro alcance de sua corrupção. As notícias se espalharam como fogo em mato seco, e a indignação popular atingiu seu ápice. O sucessor, agora visto como cúmplice e herdeiro de um regime corrupto, viu sua candidatura desmoronar.
Nos últimos dias de seu mandato, o prefeito estava só. Seus aliados políticos o abandonaram, buscando distância de um barco que claramente afundava. Seu sucessor agora enfrentava sua própria batalha legal.
O prefeito sentou-se em sua cadeira, olhando pela última vez para o relógio na parede. O "tic tac" não era mais um mero som. Era o som do inevitável, o som da verdade se aproximando, o som do fim de uma era marcada por corrupção. O prefeito sabia que, ao deixar a chefia da gestão, enfrentaria o julgamento não apenas da lei, mas do povo que um dia o aplaudiu e agora clamava por justiça.
Quando a meia-noite soou, marcando o fim de seu mandato, o silêncio do gabinete era ensurdecedor. O relógio parecia rir de sua desgraça com cada "tic tac", lembrando-o de que, no fim, o tempo é o juiz mais implacável de todos.