Arthur Lira: Quem é o líder do “centrão” que se tornou um dos mais poderosos presidentes que a Câmara já teve?

Por Infomoney 10/09/2023 22h10
Arthur Lira: Quem é o líder do “centrão” que se tornou um dos mais poderosos presidentes que a Câmara já teve?
Arthur Lira preside a sessão do Plenário - Foto: Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados

Em primeiro de fevereiro de 2023, Arthur Lira (PP-AL) foi reconduzido à presidência da Câmara dos Deputados, com 464 votos de 509 parlamentares que votaram na sessão de abertura dos trabalhos pela 57ª Legislatura. Foi uma clara demonstração de força, aglutinando apoio do PL, do ex-presidente Jair Bolsonaro, ao PT, do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (apesar de ter feito campanha aberta pelo primeiro nas eleições de 2022).

A conquista de seu primeiro mandato para o cargo, dois anos antes, também foi relativamente folgada, com 302 votos e vitória no primeiro turno. Naquele período, passaram pela mediação de Lira projetos relevantes para a economia, como a reforma do Imposto de Renda e a PEC dos precatórios, além do próprio trabalho de aproximação do chamado “centrão” ao governo Bolsonaro. Lira também mediou e chegou a ser favorável a projetos mais polêmicos, como a PEC do voto impresso e a que dava maior poder ao Congresso sobre o CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público).

Na última eleição para a presidência da Câmara, ele derrotou os deputados Chico Alencar (PSOL-RJ) e Marcel Van Hatten (Novo-RS), cada qual com 21 e 19 votos, respectivamente. O parlamentar contou com o apoio de 20 partidos e duas federações reunidos em um único bloco, na maior votação absoluta para a presidência da Câmara desde a redemocratização. Em seu discurso de agradecimento, o parlamentar foi enfático na defesa das instituições democráticas e do ganho de protagonismo do Legislativo.

Quem é Arthur Lira
Além de político, Arthur César Pereira de Lira é advogado, empresário e agropecuarista, nascido em 25 de junho de 1969 em Maceió, Alagoas.

Filho de Benedito de Lira (também político) e Ivanete Pereira de Lira, formou-se em Direito pela Universidade Federal de Alagoas em 1993, ano em que iniciou na política, como vereador de Maceió pelo antigo PFL (Partido da Frente Liberal, atual Democratas).

Desde então, sempre esteve na titularidade de algum cargo eletivo ‒ exceto por um breve período, entre dezembro de 2013 e abril de 2014, quando se licenciou para tratar de interesses particulares.

Ao todo, foram dois mandatos como vereador (de 1993 a 1999) e três como deputado estadual (de 1999 a 2011) até a sua chegada na Câmara dos Deputados, em 2011, quando ingressou ao PP (Progressistas), legenda que representa até hoje, depois de passagens pelo PSDB, PTB e PMN.

Ascensão na Câmara Federal
Já veterano na política, sua projeção ganhou força a partir da aproximação com Eduardo Cunha, quando o parlamentar, cassado em 2016, ainda comandava a Câmara Federal. Em 2015, Lira chegou a comandar a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), colegiado mais importante da Casa. Entre outras atribuições, é de responsabilidade da CCJ analisar todas as propostas que tramitam na Câmara e decidir sobre recursos apresentados contra decisões do Conselho de Ética. Como presidente do colegiado, Lira manteve o apoio a Eduardo Cunha durante o processo de cassação, inclusive emitindo parecer favorável ao investigado no processo por quebra de decoro na CCJ.

Um ano depois, o parlamentar presidiu outro importante colegiado: a Comissão Mista de Orçamento (CMO), que delibera sobre matérias orçamentárias como o Plano Plurianual (PPA), a Lei de Diretrizes Orçamentárias (PDO) e a Lei Orçamentária Anual (LOA).

De lá para cá, Lira conseguiu formar e manter um bloco de apoio político robusto, tendo se destacado novamente em 2019, quando tramitava a Reforma da Previdência. Na ocasião, o deputado conseguiu negociar acordos importantes para a aprovação da proposta.

Comando do centrão, aproximação com Bolsonaro e consolidação do orçamento secreto
Com a cassação de Eduardo Cunha, Lira se tornou a nova liderança do centrão, bloco informal de parlamentares que dá sustentação aos mais diversos governos desde a Constituinte de 1988, e que não possui uma ideologia definida.

Sob seu comando, em março de 2020, o centrão começou a se aproximar do então presidente Jair Bolsonaro (PL). Essa aliança acabou rendendo o apoio de 11 legendas, que permitiram sua eleição para a presidência da Câmara em fevereiro de 2021. Na época, Lira derrotou com ampla margem de votos o deputado e líder do MDB Baleia Rossi (SP), que era apoiado pelo então presidente da Casa, Rodrigo Maia, para ser seu substituto.

O apoio à candidatura de Kassio Nunes Marques para o Supremo Tribunal Federal (STF) e o represamento de dezenas de pedidos de impeachment contra Bolsonaro foram alguns dos fatos que mostravam o fortalecimento dos laços entre a presidência da Câmara e o chefe do Executivo. Enquanto isso, o poder de Lira crescia na gestão do orçamento secreto, criado originalmente para que o Legislativo pudesse fazer pequenas correções na proposta orçamentária e otimizar os gastos de suas bases eleitorais.

Esse mecanismo é também chamado de “emendas do relator” (ou tecnicamente pela rubrica RP9 da peça orçamentária), pois confere ao parlamentar responsável pela relatoria da LOA o direito de incluir emendas que devem ser priorizadas pelo Executivo durante a execução orçamentária.

O apelido “secreto” se dá pela falta de transparência no critério de distribuição de recursos entre os parlamentares e na dificuldade de se monitorar a execução das emendas. O uso de tal instrumento orçamentário cresceu ao longo da última legislatura, ainda na presidência de Rodrigo Maia, e tomou corpo na gestão de Lira, quando passou a ser apontado por críticos como recurso para consolidar uma base governista no Congresso Nacional.

Defensor das emendas do relator, Arthur Lira afirma que o instrumento acabou com a relação de “toma lá, dá cá” entre Executivo e Legislativo. Em entrevista à Rádio Bandeirantes no final de 2022, o parlamentar disse que é um erro chamar o orçamento de secreto. “Trata-se de um orçamento municipalista, que atende às necessidades mais urgentes da população”, segundo ele.

Relação com o atual governo e protagonismo no Congresso
Mesmo tendo apoiado a reeleição de Bolsonaro à presidência da República, Arthur Lira foi a primeira autoridade política brasileira a reconhecer a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva logo após o segundo turno. Na ocasião, destacou a força das instituições democráticas e defendeu o respeito à vontade da maioria.

“A vontade da maioria jamais deverá ser contestada, e seguiremos em frente na construção de um País soberano… Ao presidente eleito, a Câmara lhe dá os parabéns e reafirma o compromisso com o Brasil, com diálogo e transparência”, disse Lira em pronunciamento.

Protagonismo do Congresso
Em sua atuação como presidente da Câmara dos Deputados, Lira procura sempre deixar claro para o Poder Executivo, nas suas palavras, o “maior protagonismo que o Congresso alcançou nos últimos anos”.

Isso se percebe pela diferença de intensidade que imprime em diferentes pautas de interesse do Palácio do Planalto e na autonomia que a casa legislativa conquistou na definição de sua própria agenda de votação.

Sua capacidade de articulação teve papel decisivo na histórica aprovação da reforma tributária em 6 de julho. O parlamentar mediou discussões entre parlamentares, governo, setores econômicos e representantes de entes subnacionais e usou de seu capital político na casa para pressionar por um acordo em prazo apertado.

Foram necessárias concessões setoriais e acertos para o detalhamento posterior de alguns temas polêmicos, mas a proposta saiu da casa legislativa com apoio de 382 votos no primeiro turno e 375 no segundo ‒ números muito superiores aos 308 exigidos para emendas constitucionais.

Ao que tudo indica, o Senado deve impor modificações ao texto ‒ o que exigiria uma nova análise por parte dos deputados. Ainda assim, a ideia é concluir a tramitação e levar o projeto à promulgação ainda este ano.

Outro fato que ilustra o ganho de autonomia da Câmara dos Deputados foi a aprovação de projeto de decreto legislativo anulando os efeitos de trechos polêmicos de decreto editado pelo presidente Lula alterando o Marco Legal do Saneamento. O texto flexibilizava pontos nas regras de concessão atuais e nos serviços de tratamento de águas e coleta de esgoto nos municípios brasileiros. As modificações receberam críticas de associações do setor e de parlamentares. Diante do risco de nova derrota no Senado Federal, o governo recuou e editou novo decreto corrigindo os pontos contestados.

Vale lembrar também do adiamento da votação do PL das Fake News, pedido feito pelo relator Orlando Silva (PCdoB-SP) a Arthur Lira e que foi acatado no início de maio, em meio ao risco de derrota do texto em plenário. Na ocasião, lideranças do governo avaliaram que a pressão das big techs atrapalham o debate sobre o tema. Dias depois, Lira, que esteve ao lado do governo na batalha pela regulamentação do setor, sugeriu que a discussão fosse fatiada em vários projetos distintos, para que tivesse possibilidade de êxito.

Investigações
Em primeiro de junho de 2023, a Polícia Federal deflagrou a Operação Hefesto, para investigar um suposto esquema de superfaturamento na compra de equipamentos de robótica para escolas públicas de Alagoas. Teoricamente, o esquema envolveria repasse de R$ 26 milhões do MEC no governo Bolsonaro a escolas sem nenhuma estrutura para utilizar essa tecnologia.

A investigação iniciou no ano passado, mas o nome de Lira só apareceu em junho deste ano, quando policiais encontraram uma lista na qual ele constava como suposto beneficiário de pagamentos. A Megalic, empresa ligada a uma família aliada política do presidente da Câmara, tinha contratos com os referidos municípios.

Em nota divulgada no dia 25 de junho, Lira declarou que “a sua movimentação financeira tem origem nos seus ganhos como agropecuarista e na remuneração como deputado federal”.

Pouco mais de dois meses após o início dessa operação, um novo fato alterou o rumo da investigação. No dia 10 de agosto, a pedido da Procuradoria Geral da República (PGR), o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, decidiu anular as provas levantadas pela Polícia Federal. Isso porque, segundo a argumentação da PGR, o inquérito não deveria ter começado na primeira instância, mas sim junto ao STF, pois havia indícios da participação de Lira no caso desde o início da operação.