O Cinema alagoano está em luto – Partiu hoje, para a eternidade, o escritor, crítico de cinema e amigo – ELINALDO BARROS.

23/07/2021 11h11

Nestas primeiras palavras, gostaria de expressar meus sentimentos àquele que, não só contribuiu para a história do cinema alagoano, com seus escritos, críticas e livros, entre os quais: O Século do Cinema, Panorama do Cinema Alagoano, Recordações do Cinema de Bairro e Rogato, a Aventura do sonho das imagens em alagoas – que os recebi de suas mãos, anos depois de conhecê-lo, quando saia de Palmeira dos Índios, sozinho na minha cadeira de rodas, pegava o Expresso Palmeirense, com destino à Maceió, só para assistir as Sessões de Arte, comandadas por Elinaldo Barros, no antigo Cinema Severiano Ribeiro, no, antes chamado, Shopping Iguatemi. E que fizeram e fazem parte da história do cinema em Alagoas.

Assistir aos filmes, ao lado de Elinaldo Barros, era uma contemplação. Nunca aprendi tanto sobre a Sétima Arte. Principalmente o Cinema de Arte, que professava ser sua maior paixão. E sua simplicidade e conhecimento eram ímpares. Foi por isso que, em minhas pesquisas para conclusão do meu TCC/Monografia, que em seu terceiro capítulo, é dedicado ao cinema em Palmeira dos Índios, nos idos dos anos de 1960, me deleitei com suas obras. Elas não só contam a história da chegada do cinema em nosso Estado, com a chegada de Rogato e suas primeiras imagens em movimento. Mas também, somos presenteados com compilações e documentos sobre os Primeiros Festivais de Cinema – o Festival de Cinema de Penedo, por exemplo, nos anos de 1970, chamava a atenção para as produções locais. Ao maravilhoso Recordações do Cinema de Bairro, com suas lembranças saudosistas dos cinemas e suas mais variadas emoções.

Os cinemas, para Elinaldo Barros, eram mais que uma tela com projeções. Eram uma extensão de sua vida. Desde sua tenra infância:

"O cinema nos dominava de tal modo que na falta da lâmpada com água, da lanterna de pilha e dos fotogramas também se brincava de cinema com gibi. Uma caixa vazia de Maizena também tinha sua serventia. Ela era usada horizontalmente, com a parte mais larga da caixa para cima. À parte da tampa que fora usada anteriormente, para retirar o produto, servia de porta. Na metade da caixa, num dos lados largos, era aberto um quadrado que serviria para a grande tela. Imprescindíveis eram os carretéis de madeira vazios, de tamanho pequeno. Eles eram apanhados com as costureiras da redondeza, mães de vários garotos, donas de casa que sempre à tarde costuravam calças, vestidos, saias, blusas e camisas para a família ou terceiros. Os carretéis eram os espectadores, bilheteiros, porteiros, etc. Dentro da caixa-cinema de Maizena eram utilizadas caixas de fósforo vazias como se fossem as poltronas da sala de projeção. Era repetido todo o ritual de uma sessão de cinema. Com um pedaço de papel de aproximadamente dez centímetros era feita a cortina da tela, puxada por um cordão ou uma linha. Quando a cortina era aberta, uma história escolhida e, diante da tela e dos carretéis, quadrinho por quadrinho, se passava o filme. Naturalmente, se procurava dar o clima da história, lendo os diálogos e onomatopeicamente se imitava os sons dos tiros, do tropel dos cavalos. E havia a trilha musical. Infalivelmente, o “tam, tam, tam, tam” nos momentos de mais ação. Um adorável e singelo passa-tempo, que durante vários anos deixei correr solta a fantasia, sentado ao lado de uma porta, diante do quintal, sozinho e feliz."[1]

Eu adorava assistir suas aparições na TV, sempre às sextas-feiras, só para vê-lo apresentar as estreias e lançamentos da semana, além de falar um pouco de cada filme, ele sempre deixava escapar se valeria ou não, a pena assistir. E eu tinha a certeza que, ao viajar para a capital, não só saberia quais filmes assistir, mas também, o porque era importante assistir aqueles filmes. E o que cada um tinha a nos ensinar. Por isso, as Sessões de Arte, sempre às Sextas, à noite e aos Sábados, pela manhã, eram tão cheias de magia. As sessões do Cinema de Arte tiveram uma força e impactos enormes na minha formação acadêmica e científica.

Tempos depois, por motivos de saúde, ele tivera o Doença de Parkinson, e isto começou a limitar suas atividades, mas não a sua alma, que continuava intacta e pujante.  Eu o reencontrei no Cine SESI Arte Pajuçara, e falamos um pouco sobre os filmes que seriam apresentados. Foi a última vez que o vi. Que saudades desses dias!

Por isso, não me contive ao saber de sua partida desta vida. Ficam seus ensinamentos, seu amor pelo cinema, bem como um convite, àqueles que pretendem saber mais sobre a história, curiosidades, festivais e o fascínio que a Sétima Arte pode nos proporcionar, leiam seus livros, artigos e críticas. E duas coisas acontecerão: primeiro, aumentarão vossos conhecimentos sobre o cinema em Alagoas. Segundo, se apaixonarão enormemente pelas imagens em movimento.

Quando do término de meu TCC, em suas linhas finais, me expressei da seguinte forma:

“O tempo da algazarra e da alegria deu lugar ao ostracismo proporcionado pelas TVs, videocassetes e com o passar dos anos, aos DVDs – hoje poderíamos incluir os Streamings. Os cinemas já não animam Palmeira dos Índios como antes. Aliás, não há mais o que animar, pois há pouco mais de vinte anos a partir da data deste trabalho, que não se vê um cinema em terras palmeirenses. Deste modo, em lugar de criticar, talvez fosse melhor encerrar esta seção com o instigante questionamento feito por Elinaldo Barros: “O que acontece com um imenso cinema vazio de público e sem o brilho das imagens? A poeira do abandono, um silêncio profundo pelas manhãs e tardes, que antes foram tão ruidosas. E o que acontece à noite? Por acaso alguém já se perguntou sobre?”[2] E hoje, amanheci com este vazio. Amigo Elinaldo Barros, o cinema em Alagoas tem uma dívida eterna com você. E que possamos lembrá-lo do jeito que vivestes, com a alma cheia da magia das telas do cinema.

[1] BARROS, Elinaldo Soares. Cine-Lux: Recordações de um Cinema de Bairro. Maceió, edicult/secult, 1987.p. 35. [2] BARROS, Elinaldo Soares. Cine-Lux: Recordações de um Cinema de Bairro. Maceió, edicult/secult, 1987.p. 56. #elinaldobarros