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UE apoia proibição da exportação de vacina contra covid-19

05/03/2021

A decisão da Itália de bloquear o envio para a Austrália de 250 mil doses da vacina da AstraZeneca produzidas no país recebeu nesta sexta-feira, 5, o apoio de França, Alemanha e União Europeia, acirrando a disputa global por vacinas em um cenário de aumento no número de contágios na Europa e em diferentes regiões do mundo.

O país se tornou o primeiro a utilizar a nova regulamentação da UE que permite impedir as exportações das vacinas contra o coronavírus produzidas no bloco se a companhia em questão não tiver cumprido com suas obrigações contratuais.

O impedimento ocorreu em meio à lentidão do processo de vacinação na UE, que enfrenta críticas de vários de seus 27 Estados-membros. Apenas 7% dos 444 milhões de habitantes do bloco receberam pelo menos uma dose.

Destacando o papel da UE na pesquisa, desenvolvimento e produção, o governo alemão justificou a restrição à exportação. “As exportações de vacinas não serão interrompidas se os contratos com a UE forem obedecidos”, disse o porta-voz do governo alemão, Steffen Seibert. “Muitas das vacinas produzidas na UE vão para terceiros países, enquanto nada ou quase nada é exportado dos EUA ou Reino Unido.” O ministro da Saúde da França, Olivier Véran, respaldou os italianos e afirmou que seu país “pode fazer o mesmo”.

O ministro de Relações Exteriores da Itália, Luigi di Maio, disse que seu país continuará impedindo as exportações de vacinas. “Se ainda houver esses atrasos, é justo que os países da UE bloqueiem sua exportação para países que não são vulneráveis”, declarou.

A UE deixou claro que a medida não é contra a Austrália, mas um aviso para a AstraZeneca, já que não foram proibidos envios das vacinas dos laboratórios Pfizer/BioNTech e Moderna, que estão cumprindo seus contratos. O governo australiano, que já havia recebido 300 milhões de doses da AstraZeneca e também está vacinando sua população com o imunizante Pfizer/BioNTech, pediu à UE que revise a decisão.

O vice-presidente da Comissão Europeia, Valdis Dombrovskis, afirmou que a UE autorizou o bloqueio das 250 mil doses porque a AstraZeneca não está cumprindo seu contrato ao continuar com a “sistemática entrega insuficiente de doses”. Apesar das dificuldades atuais, a meta da UE é vacinar 70% da população adulta do bloco até outubro.

Permissão para exportar

Desde que o mecanismo de impedir exportações de vacinas entrou em vigor, em 30 de janeiro, a Comissão Europeia disse que 174 autorizações de exportação de vacinas para 30 países foram aprovadas. Sob a nova regra, as empresas devem pedir permissão para exportar as doses produzidas dentro do bloco e, então, Bruxelas pede a seus membros que decidam.

A UE acreditava que havia se preparado bem para a campanha de vacinação ao encomendar 400 milhões de doses da vacina AstraZeneca e selar acordos com outras empresas de mais 2 bilhões de doses. A revolta com a AstraZeneca ocorre porque a empresa prometeu 80 milhões de doses para o primeiro trimestre deste ano e terá dificuldades para entregar metade disso.

O bloco administrou 8 doses de vacinas para cada 100 residentes. Em comparação, os Estados Unidos administraram 24 doses por 100 pessoas e o Reino Unido, 32.

A União Europeia tem influência no envio de vacinas para o mundo porque a Bélgica, onde fica a sede do governo do bloco, também abriga algumas das fábricas de vacinas mais importantes do planeta, incluindo as que produzem aos imunizantes Pfizer/BioNTech e AstraZeneca/Oxford. Itália, Alemanha e Espanha também possuem instalações para vários fabricantes de vacinas.

As dificuldades logísticas fizeram a campanha de vacinação ser muito lenta em todos os países da UE, o que enfureceu muitos europeus e envergonhou seus líderes. Desde que a AstraZeneca reduziu o número de doses que esperava entregar no início deste ano, os líderes europeus atacaram a empresa, na tentativa de reduzir a raiva entre seus cidadãos.

Os fabricantes de vacinas até tiveram alguma margem de manobra em seus contratos para decidir para onde enviar as doses de uma rede global de fábricas. Mas a Itália – que sofreu um dos surtos mais severos do mundo – pressionou por uma ação mais ousada da Europa para obter mais controle.

Em meio às campanhas de vacinação dominadas por países ricos, a ação da Itália intensificou uma disputa por causa das doses que os analistas alertaram que poderia elevar os preços e reduzir ainda mais a distribuição justa de vacinas.

A AstraZeneca, que desenvolveu sua vacina com a Universidade Oxford, acabou concordando em enviar algumas doses adicionais, mas não o suficiente para apaziguar os líderes europeus que estão sob enorme pressão para acelerar a vacinação.

Os chefes de Estado e de governo da UE observam que Estados Unidos e Reino Unido estão em grande parte segurando as vacinas feitas nesses países. Os EUA rejeitaram a ideia de enviar parte de seu suprimento de vacinas para o México. E os britânicos indicaram que considerariam enviar doses para a Irlanda apenas quando o suprimento para todo seu programa de vacinação estiver garantido.

Guntram Wolff, diretor do grupo de reflexão Bruegel, com sede em Bruxelas, disse que “os governos têm o dever de proteger os próprios cidadãos”, mas uma luta cada vez maior por vacinas não serve aos interesses de ninguém. “Sempre existe o risco de retaliação”, afirmou. “No longo prazo, essa decisão nunca é uma boa ideia”, acrescentou. (Com agências internacionais)

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