Variedades

Especialista discute em SP o futuro do audiovisual

25/03/2019

Finlandesa, com certificado de residência na Dinamarca e na Inglaterra, Johanna Koljonen tem vivido nos últimos 20 anos – metade de sua vida – na Suécia. É de lá que sai regularmente para acompanhar o movimento do cinema em todo o mundo – e para apresentar, em maio, como tem feito, nos últimos anos, no Festival de Cannes, o Relatório Nostradamus. Ela conversou na semana passada com o jornal O Estado de S. Paulo, pelo telefone, antes de embarcar, no sábado, para São Paulo, onde realiza uma ‘lecture’ nesta segunda-feira, 25, às 19 h, na Unibes Cultural. Vem, a convite do Instituto Olga Rabinovich, apresentar o relatório deste ano, que, com o título de Relevance on a New Reality, analisa o futuro incerto dos fundos públicos, o impacto do mercado de streaming, que não para de crescer, e a VR, realidade virtual, que abre campos ilimitados. Nessa nova cadeia de valores, qual o papel do cinema? Os interessados podem se credenciar através do site do instituto ou assistir à apresentação, que será transmitida ao vivo pelo facebook@projetoparadisoIOR.

Projeto Paradiso, o que é isso? Num País em crise de patrocínio e no qual o governo transformou a cultura em inimiga, a boa nova é que o projeto chega como um oásis no deserto. Diretora executiva do Instituto, e responsável pela vinda de Johanna a São Paulo, Joshephine Bourgois explica que o projeto é uma iniciativa filantrópica de Olga Rabinovich, uma cinéfila apaixonada que está usando a fortuna legada por seu pai para investir no audiovisual brasileiro, por meio de bolsas de estudo e mentorias para profissionais. A primeira bolsa internacional consiste em uma maestria em escrita criativa para roteiro de cinema e TV na Escola Internacional de San Antonio de los Baños, em Cuba. Todos os detalhes e as informações sobre o projeto podem ser conferidas em www.ior.com.br. Um projeto de filantropia na sequência de uma abordagem crítica sobre o futuro incerto da indústria do audiovisual em todo o mundo? Soará como música aos ouvidos de quem assistir à dura exposição de Johanna.

O público de São Paulo poderá conferir o novo Nostradamnus Report antes de Cannes, onde será apresentado, no mercado, somente daqui a dois meses. Johanna vai ao ponto. “Estamos vivendo o que parece uma era de ficção científica. O futuro chegou, com novas tecnologias, novas plataformas e formas de produção e exibição. Parece uma abertura extraordinária. Olhando de perto, o cenário é de crise. Um filme de terror.” A análise que Johanna faz, a partir de seus encontros com figuras representativas do cinema de todo o mundo, extrapola o interesse da categoria. Diz respeito a nós, o público.

“Já faz tempo que falamos de mudanças estruturais. Nos próximos 3 a 5 anos veremos aonde nos levará a reestruturação do mercado de streaming. Será dominado por poucas companhias de tecnologia e majors consolidadas. De que maneira isso irá impactar players locais e linguagens menores ainda é incerto. A questão será como competir quando a competição pode superar você em recursos e produzir conteúdo de ótima qualidade. A resposta é uma só. A indústria, o que resta dela, produz diversão. A produção independente tem de focar em histórias que não interessam ao cinemão, mas que valem contar. Relevância é a palavra de ordem.”

Johanna edita o Relatório Nostradamus para o Festival Internacional de Göteborg e o Lindholmen Science Park, que patrocinam sua análise prospectiva do futuro do cinema. Johanna relata que os entrevistados do relatório deste ano trouxeram questões urgentes relativas a relevância e sustentabilidade. E ela é direta – pense na Mostra ameaçada, no Belas Artes sem patrocínio e em todas essas reportagens que você leu recentemente no jornal O Estado de S. Paulo sobre o governo retirando patrocínio à cultura. “Estamos vivendo tempos em que o financiamento público se tornou mais necessário que nunca, mas também está francamente ameaçado. A indústria precisará encontrar mais maneiras de priorizar suas ações e de comunicar melhor para o público e os parlamentares que o que ela faz é vital.”

O Brasil tem estado no centro desse furacão. Embora a indústria do audiovisual gere empregos e multiplique por quatro cada real investido – segundo dados apresentados num painel sobre o cinema brasileiro, na Berlinale, em fevereiro -, as leis de incentivo estão claramente ameaçadas. E Johanna destaca: “O financiamento público ao audiovisual está decrescendo também na Europa. Para garantir a continuidade, o cinema precisa de novos indicadores de performance que não são só os das finanças. Cinema é cultura e, como tal, precisa ser analisado em aspectos como educação, impacto social e valores democráticos.”

No momento em que as projeções indicam que o mercado de entretenimento será dominado por companhias (dos EUA) que visam somente o retorno econômico, a reação terá de ser alternativa. Filmes que se viabilizem e encontrem respaldo na sociedade, com histórias que reflitam a realidade complexa em que estamos inseridos.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Autor: Luiz Carlos Merten
Copyright © 2019 Estadão Conteúdo. Todos os direitos reservados.