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O corpo desta jovem de 23 anos está virando pedra

18/07/2015
O corpo desta jovem de 23 anos está virando pedra
Chanel White, de 23 anos, está vivendo com uma doença crônica rara que lentamente enrijece sua pele e órgãos. (Foto cortesia de Chanel White)

Chanel White, de 23 anos, está vivendo com uma doença crônica rara que lentamente enrijece sua pele e órgãos. (Foto cortesia de Chanel White)

 

Eu fui diagnosticada com esclerodermia sistêmica assim que completei 20 anos, apenas algumas semanas depois de minha lua-de-mel, em outubro de 2011.
Eu nunca tinha ouvido falar de esclerodermia antes do meu médico me dar este diagnóstico. A esclerodermia é uma doença autoimune, onde o corpo produz demasiado colágeno. É como se alguém estivesse colocando cimento dentro de você.
Na esclerodermia sistêmica, o colágeno não só se acumula em sua pele e seu sistema vascular, mas também em seu tecido conjuntivo, a estrutura do corpo humano. Sem tecido conjuntivo, você seria tipo maria-mole e ficaria esparramado pelo chão. Se você tem demasiado, como eu, você basicamente se torna em uma estátua viva.
Essa doença é rara – acontece em menos de 500.000 americanos – e não tem cura. Você pode viver cinco meses ou 20 anos. Mas com base na rapidez dos meus sintomas quando fui diagnosticada, me disseram que viver mais 10 anos seria sorte. Isso foi há três anos atrás.
Nesse tempo, eu percebi que algo assim tão danificado continua podendo ser bonito. Eu aprendi que existe alegria em abrir mão do que você não pode mudar, em abrir mão do destino que você acredita ser o seu, e em vez disso, aceitar, reverenciar e celebrar tudo o que a vida dá. Meu corpo já não me deixa fazer muita coisa, e eu tenho que aceitar isso. Quando você consegue realizar isso, é possível encontrar a beleza em um corpo tão cheio de problemas.

Um dia de minha vida

Na mídia existem sempre essas histórias de pessoas que fizeram coisas maravilhosas quando ficaram doentes, e honestamente, para mim e para muita gente na minha situação, isso não é bem assim. A gente dorme muito, vai muito ao médico, toma muito remédio, sentindo-se demasiadamente doente para fazer o que quer que seja. Claro que as pessoas não se interessam por essa história – ela é chata, mas é a realidade. Estar doente não é glamoroso e é importante que as pessoas entendam isso.
Quando eu acordo de manhã, tenho sempre muita dor. Há sempre uma nova onda de dor quando eu acordo. É simplesmente a compreensão de que, sim, este é o seu corpo, é isto que você está vivendo.
Meu café-da-manhã começa com um monte de comprimidos, mais um monte de suplementos líquidos, e depois meu tubo de alimentação é ligado. Eu tomo 28 tipos diferentes de remédios por dia, várias vezes ao dia. Eu produzo colágeno em excesso em meu trato digestivo, e essencialmente, meu esôfago, meu estômago e meus intestinos são uma pedra. Eu não consigo engolir comida, e meu estômago não esvazia. É como tentar fazer uma pedra comer alguma coisa – tudo está paralisado.
Estou ligada a tubos de alimentação entre 14 a 15 horas por dia. A nutrição passa por uma bomba para uma entrada em meu abdômen. Meu estômago não consegue lidar com muita quantidade ao mesmo tempo, então o alimento tem que passar muito, muito devagar – cerca de 60 ml por hora.
Basicamente, tenho entre uma a três consultas médicas por dia. Eu tenho uma entrada em meu peito pra infusões de quimioterapia. Recebo infusões de ferro a cada cinco dias. Tenho até 20 consultas em um mês. É sufocante. Você não tem muito tempo para você mesmo quando você está doente.
A vida não é muito glamorosa. Eu vejo muita TV, tiro muita soneca, vomito muito e me sinto horrível. Também converso bastante com amigos no Facebook, e escrevo em meu blog quando estou forte o suficiente. Eu vivo de pijama. Provavelmente tenho mais pijamas do que tenho roupas de sair.
Na mídia social, eu posto fotos minhas sorrindo, com maquiagem, quando saio de casa. Eu não quero que as pessoas interpretem a doença de maneira errada. Mas eu também quero fotografar os momentos em que estou aproveitando a vida, porque eles não são frequentes. Eu acredito que é importante mostrar que ainda dá para aproveitar a vida num corpo doente, mas também é importante que as pessoas entendam que essa foto minha sorrindo não sou eu, é uma máscara que eu visto. São as raras ocasiões em que eu tento desfrutar os bons momentos conforme acontecem.

Um diagnóstico repentino e chocante

Eu comecei a ter sintomas pouco antes de ser diagnosticada. Foi o tipo da coisa que aconteceu da noite para o dia, e você olha para baixo e fica se perguntando “o que está acontecendo com meu corpo?”
Minhas mãos ficavam com um horrível tom de roxo violeta, completamente dormentes. Eu nunca pensei muito nisso; achava que minhas mãos eram frias. Mas não era frio – isso acontecia em ambientes acima dos 20ºC. Depois de algumas semanas, eu comecei a perder cabelo, me sentia cansada o tempo todo, e as pontas dos meus dedos começaram a ficar esquisitas.
Um dia, eu olhei para baixo e pensei que tinha queimado meu dedo cozinhando. Parecia que eu tinha assado meu dedo na grelha quente. Estava preto, escamoso e doendo horrores. Só em tocar já era insuportável. Isso não passou e eu estava piorando, por isso finalmente fui a um médico.
Assim que ele me viu, ele disse: “Você tem esclerodermia.”
Regra geral, chegar a um diagnóstico de esclerodermia leva anos. Muita gente é diagnosticada erroneamente com lúpus ou outras doenças autoimunes. Eu simplesmente entrei no consultório e nem tive a chance de dizer “bom dia” e o médico já estava dizendo que eu tinha essa doença horrível. Eu não sabia o que fazer. Ele me deu folhetos para ler, quilos de remédios para buscar na farmácia, e uma nova maneira de viver, para começar. Depois vieram a quimioterapia e os imunossupressores. Minha vida mudou drasticamente depois dessa consulta.
Meus dedos são rígidos e inchados, e eu não os consigo endireitar. Eles criam essas chagas – essa palavra nem descreve bem – são úlceras de pele e tecido morto. Isso acontece porque esse cimento não só ataca minha pele, mas está esmagando meu sistema vascular.
Quando recebi o diagnóstico, muita gente pensou que isso só afetava minhas mãos. Elas perguntavam, “como vão suas mãos?” E eu tentava explicar, “Sim, minhas mãos estão roxas, dá para ver as feridas nelas, mas isso também está acontecendo em meus órgãos.”

Tornando meu próprio caixão

Desde o meu diagnóstico, tem sido uma bola de neve, um problema após o outro. Em dezembro de 2014, eu estava subindo as escadas do shopping e desmaiei. Fui levada às pressas para a emergência. Meu corpo tinha simplesmente parado. Eu não podia andar, não podia levantar a cabeça – eu estava simplesmente deitada em uma cama de hospital com uma máquina que respirava por mim. Eu fiquei basicamente acordada por um mês, mas não podia fazer nada por conta própria.
Meu sistema imunológico é quase inexistente, então eu fico doente com muita facilidade. Acabei ficando com meningite C. diff (Clostridium difficile, uma infecção bacteriana), e fluído espinal em meu cérebro. Chegou até ao ponto em que eu basicamente disse à minha família: “é hora de dizer adeus.”
Eu recuperei, como é óbvio, e fiz reabilitação. Aprendi a andar novamente, igualzinho às pessoas que passaram por cirurgia nos quadris.
No ano passado, a doença começou a atacar os músculos do meu sistema respiratório. Meu diafragma funciona apenas com 18% de capacidade, e respirar é muito difícil. Eu ando sempre com um tanque de oxigênio, pois se eu falar muito, ou andar muito tempo, não tenho a capacidade de impulsionar meu diafragma a mover e expandir meus pulmões. Essa doença realmente acaba com todo e qualquer pequeno pedacinho de uma pessoa.

Apoio forte

Sou muito grata ao fato que toda minha família vive por perto. Meu maior suporte é meu marido, e estamos casados há quatro anos.
Nós éramos namorados desde a escola. Eu era uma ginasta de competição e ganhei uma bolsa de estudos para me graduar em performance vocal. Nosso plano era ir para a faculdade juntos. Nós tínhamos objetivos. Depois, as coisas mudaram, ele tem se adaptado e me apoiado demais. Sempre que fico no hospital, ele dorme na desconfortável poltrona. Às vezes fico no hospital por até um mês.
Eu absolutamente não seria capaz de enfrentar esta batalha sem ele. Não vou mentir e dizer que meu espírito não se abate e que eu não fico revoltada de estar morrendo aos 23 anos. Há momentos em que eu não consigo ser forte; não está em meu poder nesse momento. Ele é capaz de apenas olhar para mim, e dizer, “Está tudo bem.” Ele não diz que tudo vai ficar bem, porque nós dois sabemos que isso não é verdade. Mas está tudo bem onde estamos. Estamos juntos e ele vai estar lá.
Aprendendo a abrir mão
Esta doença abriu meus olhos para o mundo. Antes de ficar doente, eu realmente não tinha a perspectiva de que a vida pode acabar num piscar de olhos. Não passei por grandes tragédias enquanto crescia. Não testemunhei muitas mortes, nem muita doença. E agora eu fui jogada neste mundo onde há sempre morte e sempre doença. Eu vi amigos meus morrerem. Vi pessoas passarem por sofrimento que nenhum ser humano deveria ter que suportar. Eu vejo agora que a vida é algo muito frágil, e que pode se despedaçar em uma fração de segundo. Quando isso acontece, não dá para simplesmente voltar a colar os pedaços – você apenas tem que seguir em frente como uma pessoa que mudou.
Eu sinto que me tornei uma pessoa completamente diferente desde que fiquei doente, como se eu tivesse descoberto esta parte de mim que eu não sabia que existia. Eu sou mais forte, mais resistente. Entendo que eu preciso parar e tirar tempo para fazer o básico, como cheirar as flores, ir pelo caminho mais longo e simplesmente apreciar as pequenas coisas. As pequenas vitórias são importantes. Eu fico feliz de poder ter uma cama. Fico feliz de conseguir chegar até o sofá. Fico feliz de conseguir beber um golinho de Gatorade e não vomitar.
As pessoas podem dizer que eu aprendi a não receber as coisas de graça, mas não é bem assim. Eu não acho que as pessoas recebem as coisas de graça, se não entendem. Eu não acho que alguém seja uma pessoa ruim só por comer um cheeseburger sem o saborear. Quando você está doente, você passa a ter um modo de vida diferente. Você aprende a aceitar. Você aprende que, nossa, poder comer um cheeseburger é realmente o máximo.
Não é se você recebe as coisas de presente ou não – é sobre entender e aceitar a vida que você tem. E fazer disso o melhor que você puder. E celebrar as coisas como elas são.

Visite o blog de Chanel White em thetubefedwife.blogspot.com