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Procurador-geral de Justiça pede suspensão do ‘Parque Minhocão’

12/06/2019

O procurador-geral de Justiça de São Paulo, Gianpaolo Smanio, moveu uma Ação Direta de Inconstitucionalidade contra a lei aprovada pela Câmara Municipal de São Paulo em 2017 e promulgada pela gestão João Doria (PSDB), em fevereiro de 2018, que prevê a desativação gradativa do Elevado Presidente João Goulart – o Minhocão – para a criação de um parque municipal. A ação é endereçada ao presidente do Tribunal de Justiça, Manoel Pereira Calças.

Liminarmente, Smanio pede que a execução do projeto seja suspensa. “O perigo da demora decorre especialmente da ideia de que sem a imediata suspensão da vigência e eficácia dos preceitos questionados, subsistirá a sua aplicação, com um crescimento desordenado da cidade, com comprometimento ao planejamento urbanístico, ao bem estar da população, à qualidade de vida e ao desenvolvimento sustentável da comuna, que dificilmente poderão ser sanados, na hipótese provável de procedência da ação direta”.

Além da promulgação da Lei, um ano antes, em fevereiro de 2019, o prefeito Bruno Covas (PSDB), sucessor de Doria, tomou a decisão de executar o projeto. A necessidade de se desativar o Minhocão foi determinada pelo Plano Diretor da cidade de 2016, criado na gestão de Fernando Haddad (PT). Mas, à época, ele deixou em aberto o que seria feito com a estrutura.

As obras para adaptação das quatro faixas elevadas, construídas na década de 1970, estão previstas para terem início no segundo semestre deste ano. A expectativa é de que o primeiro trecho do parque, da Praça Roosevelt até o Largo do Arouche, fique pronto já em 2020, a tempo de Covas apresentar a obra como uma “marca” de sua gestão para a disputar a reeleição.

Para o procurador-geral de Justiça, Gianpaolo Smanio, no entanto, a Lei fere a Constituição do Estado de São Paulo. Segundo ele, o fato de o texto ter origem no Legislativo fere a competência exclusiva do Poder Executivo para decidir sobre o tema. No mérito, sustenta que fere o princípio do planejamento para a edição de leis sobre diretrizes urbanas.

Planejamento

Segundo Smanio, da Constituição Estadual “pode-se extrair que planejamento é indispensável à validade e legitimidade constitucional da legislação relacionada ao desenvolvimento urbano”.

“E não poderia ser diferente, vez que eventuais alterações nesta temática produzem significativas modificações na geografia e dinâmica urbana, seja em termos de mobilidade, saneamento, questões ambientais e outras, sendo imperiosa a elaboração de minucioso planejamento técnico destinado a apontar eventuais desdobramentos resultantes da mudança do ordenamento urbano”, anotou.

O procurador-geral diz que “não há dúvida de que o planejamento é necessário na fase de elaboração do Plano Diretor. Mas não é suficiente por si só, pois todos e quaisquer projetos de lei ulteriores, que tratem do uso do solo e da respectiva proteção ambiental também devem ser submetidos a análises prévias”.

Smanio ressalta que “para que a norma urbanística tenha legitimidade e validade, deve necessariamente decorrer de um planejamento, definido como um processo técnico instrumentalizado para transformar a realidade existente de acordo com objetivos previamente estabelecidos”.

“Não pode decorrer da simples vontade do administrador, desprovida, em muitos casos, de elementos vinculados às reais necessidades do território e de sua população, mas de estudos técnicos que visem assegurar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade (habitar, trabalhar, circular e recrear) e garantir o bem-estar de seus habitantes”, afirma.

“O ato normativo que altera sensivelmente as condições, limites e possibilidades do uso do solo urbano, sem realização de qualquer planejamento ou estudo específico, viola diretamente a sistemática constitucional na matéria”, conclui.

Competência

O procurador-geral também afirma que a Lei Municipal, “ao criar o ‘Parque Minhocão’ e prever a desativação gradativa do “Elevado João Goulart”, vulnera o princípio da separação de poderes por se tratar de matéria de iniciativa exclusiva do Chefe do Executivo, interferindo indevidamente na gestão administrativa do Município”.

Smanio sustenta que a “instituição de programas destinados à execução de políticas públicas, executados direta ou indiretamente pelo poder público, e, enfim, da organização e funcionamento da Administração Pública, situa-se no domínio da reserva da Administração, espaço conferido com exclusividade ao Chefe do Poder Executivo no âmbito de seu poder normativo imune a interferências do Poder Legislativo, e que se radica na gestão ordinária dos negócios públicos”.

“Ora, no caso em exame, constitui ato da competência privativa do Poder Executivo a criação de parque municipal, a forma de sua implantação, a conveniência do desenvolvimento de ações de sustentabilidade e a apresentação de projeto de intervenção urbana”, diz.

Liminar

Segundo o procurador-geral a concessão de liminar para suspender a execução do projeto é urgente. “Basta lembrar que a desativação da importante via de circulação e a implantação do parque municipal em seu lugar poderá levar a situações urbanisticamente não desejáveis, que poderão gerar conflitos e intranquilidade na comunidade”.

“A ideia do fato consumado, com repercussão concreta, guarda relevância para a apreciação da necessidade da concessão da liminar na ação direta de inconstitucionalidade”, escreveu.

“Assim, a imediata suspensão da eficácia das normas impugnadas evitará a ocorrência de maiores prejuízos, além dos que eventualmente já se verificaram. De resto, ainda que não houvesse essa singular situação de risco, restaria, ao menos, a excepcional conveniência da medida”, reforça.

A Lei

O texto aprovado na Câmara e promulgado pela Prefeitura em 2018 prevê que, inicialmente, o horário de funcionamento para tráfego de veículos motorizados nos dias úteis seja restrito para o horário das 7h às 20h.

De acordo com a Lei, a Prefeitura, “incentivará atividades culturais, esportivas e de lazer no Elevado João Goulart, por parte da comunidade e de entidades da sociedade civil, assim como garantir as adequadas condições de segurança no local durante os horários de fechamento ao tráfego de veículos, bem como desenvolverá ações de sustentabilidade destinadas a preservar e ampliar a área verde no local”.

COM A PALAVRA, PREFEITURA DE SÃO PAULO

“A Prefeitura ainda não foi intimada da referida ação e a Procuradoria Geral do Município avaliará suas estratégias jurídicas assim que notificada”.

COM A PALAVRA, O VEREADOR CAIO MIRANDA (PSB)

Por meio de sua Assessoria de Imprensa, o vereador Caio Miranda (PSB) declarou.

“O Ministério Público do Estado de São Paulo atendendo a um pedido protocolado em janeiro deste ano pelo vereador Caio Miranda Carneiro (PSB/SP) ajuizou uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) contra a Lei Municipal 16.833/2018 que determina a criação do Parque Municipal do Minhocão.”

“A Lei é flagrantemente inconstitucional, vereador não pode praticar ato concreto típico do Executivo e a criação de um Parque, da forma como foi feita, configura esse ato concreto viciado e insanável. Se a ADIN não prosperar, nós vereadores poderemos brincar de prefeito e criar parques e hospitais. É uma irresponsabilidade! Espero que a ADIN seja o primeiro êxito na volta da sobriedade sobre a decisão do futuro do Minhocão.”

“A criação de parques, hospitais, escolas, entre outros, deve ser feita unicamente pelo Poder Executivo justamente porque depende não só de recursos, mas porque exige planejamento financeiro e técnico, execução de obras e envolve a participação de uma série de órgãos e servidores – interferindo diretamente, portanto, na organização administrativa.”

“O Ministério Público dando este passo demonstra concordância na inconstitucionalidade da Lei que determina que o Elevado João Goulart, hoje utilizado para lazer quando fechado, se torne Parque por decreto feito pela Câmara dos Vereadores.”

Autor: Luiz Vassalo e Fausto Macedo
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