Política

‘Vitória na capital me credencia à Prefeitura’, diz Márcio França

10/12/2018

Derrotado por João Doria (PSDB) por uma diferença de 3% dos votos, o governador Márcio França (PSB) já definiu seu futuro político. Depois de um breve período de descanso em São Vicente, sua cidade natal, vai começar a articular sua candidatura à Prefeitura de São Paulo em 2020 baseada no recall de 10 milhões de votos que obteve na disputa estadual. Nesta entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, França fala sobre seu planos, analisa o resultado eleitoral e defende que o PSB marche separado do PT, mas na oposição ao governo de Jair Bolsonaro.

O senhor vai disputar a Prefeitura de São Paulo em 2020?

Não foi pra isso que encaminhei meu roteiro, mas o resultado de São Paulo foi fabuloso, vejo quando ando pelo cidade, especialmente nas periferias. É claro que o ideal seria ganhar, mas saí maior do que entrei dessa eleição. E a vitória na capital me credencia a disputar a Prefeitura (França obteve 58% da preferência do paulistano no segundo turno).

Então não vai prometer ao atual prefeito, Bruno Covas, que não disputará a Prefeitura, como Doria fez com o senhor em relação ao Estado?

Não. A grande eleição daqui a dois anos é a de São Paulo.

O que pretende fazer até lá? Vai voltar a dirigir o PSB estadual?

Sim, e vou ajudar nacionalmente também. Como todo mundo acompanhou a eleição de São Paulo muita gente agora quer me conhecer. O ideal era fazer uma reestruturação do ponto de vista do formato partidário. Hoje, os partidos são muito distantes da população.

E como seria essa reestruturação?

Eu defendo desde o tempo do Eduardo (Campos, ex-governador de Pernambuco, morto em 2014, quando disputava a Presidência pelo PSB) uma modificação estatutária que desse à militância virtual força de voto. A tese é simples: um aplicativo onde os filiados pudessem se manifestar sobre determinada questão. Ele vota e a decisão dele é impositiva em relação à bancada. Isso daria às pessoas uma força que elas não têm hoje. É preciso radicalizar a democracia partidária.

Doria venceu por colar no senhor a pecha de esquerdista?

Não. Ele tem méritos, é determinado. É claro que não imaginava essa dificuldade toda, acho que para ele foi uma surpresa disputar comigo e não com Paulo Skaf. É difícil perder, mas essa eleição foi nacionalizada demais. No fim, quando (Fernando) Haddad subiu um pouco, os dois lados radicalizaram ainda mais. Em cidades grandes do interior, esse negócio de PT, MTST funcionou. Mas o meu posicionamento é de centro.

O PSB estará junto ou separado do PT?

Por mim, separado.

Como deve ser o posicionamento do PSB em relação ao governo Bolsonaro?

Eu não me reuni com a bancada, mas a tendência é ser oposição. Quem coloca a gente na oposição é o povo. No segundo turno, o meu partido, contra a minha vontade, anunciou apoio ao Haddad. Como então vamos ser situação agora? O que acontece, no entanto, é que na prática não se tem o controle sobre todos os deputados, aliás não sei quem vai ser base do Bolsonaro. Tenho dúvidas até sobre os deputados do PSL.

Por quê?

Os deputados do PSL não têm tradição partidária. Não sei se vão fazer sacrifícios. Não vejo um grau de lealdade nem sinto uma organização ideológica no partido. Eles são desse mundo youtuber da internet.

O senhor está participando desse movimento de centro, que começa a se formar?

Sim, o que eu acho: todo mundo gostaria de encontrar uma fórmula nova, não um partido, mas uma fórmula. Os partidos são analógicos e o mundo agora é digital. A militância no meu tempo colocava cartaz em poste, fazia panfletagem. Esse mundo físico não existe mais. Eu sei que é um contrafluxo, mas a solução é virar ao centro, na acomodação de soluções, em busca de um consenso.

O que seria isso?

Não estou falando de um centro ideológico. O caminho, acho, não é achar que tudo está certo ou tudo errado. Na minha visão, esse miolo é maior do que as bordas. O problema é que as bordas contornam o miolo e dão o tom. Do ponto de vista do País, ficou a direita do Bolsonaro e a esquerda do PT. Bom seria que esse movimento fosse um partido, mas não vejo como juridicamente. E tem eleição municipal daqui a dois anos, quando se vai enxugar mais ainda. Vão sobrar uns sete, oito partidos, do ponto de vista financeiro e de tempo de TV.

E uma federação?

Ah, isso seria um grande negócio. Na federação se mantêm as autonomias administrativas e financeiras dos partidos. É como um bloco, mas não apenas para atuação parlamentar, mas também para as eleições. Ela obriga a coligação por quatro anos, força todo mundo a caminhar junto. Mas, sem essa possibilidade legal, o que resta é assumir compromissos na palavra. Haverá de ter uma solução na política e não vejo outra maneira.

Pode nascer um novo partido de centro?

Pode ser, mas como se faz isso na prática? Com um partido totalmente novo? Até a eleição de prefeito é impossível. O que puxa um partido é um nome. Quem conhecia o Luciano Bivar, do PSL? Foi o Bolsonaro quem fez o PSL.

Como o senhor quer ser lembrado por essa passagem pelo governo?

Olha, eu me sinto muito realizado, era uma sonho. Acho que deixo como legado uma disposição maior para o diálogo, seja com os funcionários públicos ou com as pessoas nas ruas mesmo. Eu acho que a gente resolve na conversa. E, diferentemente do (ex-governador Geraldo) Alckmin, que é protocolar, eu sou mais informal.

O que o senhor vai fazer a partir do dia 1º? Vai voltar a advogar?

Sim, ainda não sei se vou abrir escritório, mas vou voltar a advogar sim. Preciso trabalhar, mas antes vou recuperar o físico, emagreci muito e preciso fazer exercícios. Vou voltar a surfar e, quem sabe, fazer um livro sobre a campanha e o falecimento do Eduardo (Campos). Foi um episódio muito forte no cenário nacional. Ele era a pessoa que podia fazer essa intermediação (entre direita e esquerda). As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Autor: Adriana Ferraz e Pedro Venceslau
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