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Maldonado: Renúncia de PPK será lembrada em países envolvidos com Odebrecht

22/03/2018

Pedro Pablo Kuczynski é o primeiro presidente latino-americano a deixar o cargo por ligação com o escândalo Odebrecht. Por isso, o caso peruano deve ser usado como exemplo das consequências políticas aos envolvidos em corrupção, afirmou ao jornal O Estado de S. Paulo o cientista político peruano, doutor pela Universidade de Vanderbilt, Arturo Maldonado. “Esse será um exemplo do ponto que chegou a corrupção dentro da esfera política”. A seguir trechos da entrevista:

Qual a diferença prática entre a renúncia e o impeachment no Peru?

Para efeitos práticos dá na mesma, mas se a renúncia não fosse aceita e continuassem com o processo de impeachment, a destituição viria com sanções políticas, como a inelegibilidade por determinado número de anos. Foi o que aconteceu com Alberto Fujimori. A renúncia dele por faz não foi aceita e o Congresso o destituiu.

Como o caso peruano afeta outros envolvidos no escândalo Odebrecht?

Este será um exemplo do ponto que chegou a corrupção dentro da esfera política. E mostra o que pode acontecer com um presidente que esteve envolvido em corrupção. O caso do Peru sempre vai ser citado como o país em que o presidente envolvido foi expulso e agora é investigado como qualquer civil na Justiça comum.

Como atinge a Cúpula das Américas, marcada para abril?

Se em algum momento o novo presidente peruano decidir não assumir, haverá mais instabilidade e a cúpula poderia até ser cancelada ou adiada.

O indulto a Fujimori pode ser revertido?

Sim. É possível que a Corte Interamericana de Direitos Humanos emita uma opinião desfavorável ao indulto e agora caberá ao novo presidente decidir o que fazer. Pela assinatura dos tratados com a Corte, o Peru estaria obrigado a acatar a recomendação, mas Kuczynski deixou dúvidas se aceitaria, pois precisava continuar com o pacto feito com o fujimorismo. O novo presidente não está atado à obrigação que tinha Kuczynski.

Conceder o indulto foi uma ação equivocada?

Sim. Kuczynski havia especulado no começo de seu governo que estava de acordo com um indulto ao dizer que um ex-presidente não deveria morrer na prisão. A surpresa foi usar isso como troca para se manter no cargo. Além disso, o indulto foi concedido logo após ele se salvar na votação de dezembro, o que deixou claro que era uma jogada e isso afastou sua base de apoio, mesmo que frágil. Eram votos da esquerda contrários ao fujimorismo.

O fujimorismo sai fortalecido ou enfraquecido?

Sai muito debilitado. No começo do governo, era o grupo majoritário, uma das bancadas mais numerosas da história do Peru e com uma liderança clara de Keiko Fujimori. Passado esse processo, temos duas facções do fujimorismo desacreditadas. A facção de Kenji por causa da compra de votos e a de Keiko por ter atrasado o governo de PPK e usado a estratégia de gravar os vídeos, que remete ao caso de Vladimiro Montesinos. Além disso, a força de Keiko no Congresso é atualmente uma das instituições mais desacreditadas do Peru.

A linha da política externa peruana terá alguma mudança?

Não deve mudar. (Martín) Vizcarra não tem uma visão radical, não é um Maduro que vá enfrentar Trump, mas também não é um personagem totalmente à direita que vá enfrentar Evo Morales. Ele é muito moderado.

Como o caso Odebrecht vai impactar os políticos peruanos agora?

O mais afetado ainda será Kuczynski porque ele perde a imunidade presidencial. Ele poderá ser testemunha ou réu nos casos Odebrecht. Mas, claro, o caso atinge toda a classe política peruana.

Vizcarra tem um prazo para decidir se renuncia à presidência?

Normalmente, o vice já é considerado presidente a não ser que renuncie. Mas nesse caso, Vizcarra não está no Peru então não pode ser investido automaticamente pelo Congresso. Temos agora um presidente a longa distância sem ter sido propriamente investido pelo Congresso, uma situação um pouco estranha.

Vizcarra tem as condições para resgatar a estabilidade política?

Isso não depende apenas dele, mas também da oposição do Força Popular. Ele vai ter um período de lua-de-mel, mas tem pouco tempo para costurar acordos políticos novos e dar sustentabilidade a seu governo. No início, convém à Força Popular apoiar o governo, mas com vistas à próxima eleição o mais conveniente será ser oposição então a estratégia de acusações voltará.

Vizcarra também é investigado.

Ele era ministro de Transportes e Comunicações e teve que renunciar antes de o Congresso impusesse uma moção de censura pelo caso de um aeroporto que está sendo construído em Cusco. Há uma investigação em curso e agora alguns dizem aos fujimoristas ‘como em menos de um ano vocês diziam que ele era um corrupto e agora o aceitam?’. Há um jogo nisso e essa investigação pode se tornar uma arma política a longo prazo para o Fujimorismo.

A segunda vice-presidente, Mercedez Aráoz, teria mais ou menos condições políticas?

Ela era a primeira-ministra do ex-presidente Kuczynski então ganhou muitos opositores. Ela não soube melhorar a relação com o Força Popular ou criar novos acordos políticos. Além disso, ela é deputada e o Congresso decidiu começar uma moção para remover os congressistas envolvidos nos vídeos de compra de votos contra o impeachment e ela é uma deles.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Autor: Fernanda Simas
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