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MPF promove reuniões sobre escutas telefônicas feitas pela Segurança Pública de Alagoas

23/10/2017
MPF promove reuniões sobre escutas telefônicas feitas pela Segurança Pública de Alagoas
​Reunião realizada na Procuradoria da República em Alagoas com a Secretaria de Segurança Pública do Estado de Alagoas (SSP/AL), em 18 de outubro de 2017

​Reunião realizada na Procuradoria da República em Alagoas com a Secretaria de Segurança Pública do Estado de Alagoas (SSP/AL), em 18 de outubro de 2017

O Ministério Público Federal (MPF) em Alagoas promoveu reuniões com representantes do Sindicato dos Delegados de Polícia Civil do Estado de Alagoas (Sindepol/AL), do Sindicato dos Policiais Civis de Alagoas (Sindpol/AL) e da Secretaria de Segurança Pública do Estado de Alagoas (SSP/AL) para tratar da operacionalização das interceptações telefônicas por meio da Polícia Militar e SSP e do Estado de Alagoas (PM/AL).

As reuniões ocorreram nos dias 17 e 18 de outubro, na sede do MPF em Alagoas, a pedido dos próprios representantes dos sindicatos e da secretaria de Segurança Pública, a fim de tratar dos termos da Recomendação n. 04/PRAL/NGARK/2017, expedida em 28 de agosto. No documento, a procuradora da República Niedja Kaspary recomenda à SSP a adoção de medidas concretas no sentido de fazer cessar a operacionalização de interceptações telefônicas por meio de órgãos alheios à estrutura da Polícia Judiciária e do Ministério Público.

O acesso a informações sigilosas por pessoas diversas do quadro da Polícia Civil é investigado pelo MPF, por meio do procedimento preparatório n. 1.11.000.000543/2017-44. Segundo notícia ao Órgão Ministerial, informações colhidas por meio de interceptações telefônicas regularmente autorizadas pelo Poder Judiciário, estariam sendo manipuladas por agentes da Assessoria Integrada de Inteligência, mesmo sendo órgão alheio à estrutura da Polícia Judiciária e do Ministério Público.

Reuniões – Nas reuniões realizadas no dia 17 de outubro (Ata – Sindpol/AL; Ata 02 – Sindepol/AL), o Presidente do Sindpol, Ricardo Nazário, bem como o Presidente do Sindepol, José Carlos André dos Santos, argumentaram a favor da recomendação expedida pelo MPF. Justificaram que, embora a PM/AL não tenha como atribuição presidir inquéritos, ela vem atuando em flagrantes delitos, a partir de informações obtidas nas escutas, em prejuízo da continuidade das investigações realizadas pela Polícia Civil de Alagoas (PCAL).

Além disso, informaram que a PM/AL foi privilegiada com um sistema de investigação mais moderno, chamado o Guardião Web, adquirido com recursos do Ministério da Justiça, e no entanto a Polcía Civil conta com um sistema arcaico, comparado ao que se encontra na SSP; que até o Disque Denúncia (181), criado pela PCAL, está com a PM/AL, sendo utilizado para empreender flagrantes de interesse da instituição; e que a suposta integração da gestão entre a Polícia Civil e a Polícia Militar inexiste, uma vez que a gestão somente é feita pela PM/AL. Acrescentaram ainda que Polícia Civil tem condições de operacionalizar todas as interceptações telefônicas no estado e que, historicamente, a PCAL sempre efetuou tais interceptações.

Na reunião realizada na última quarta-feira, 18 (Ata – SSP/AL), solicitada pela SSP/AL, o Secretário de Segurança Pública, Paulo Domingos de Araújo Lima Júnior, informou que a Secretaria de Segurança Pública opera a interceptação com controle externo do Ministério Público Estadual, sempre mediante prévia decisão judicial. Argumentou que a legislação estadual de Alagoas coloca o secretário de segurança e os secretários adjuntos como autoridades da Polícia Civil e justificou as interceptações telefônicas como objeto da integração de todas as forças policiais.

Rebatendo os argumentos dos presidentes do Sindpol e do Sindepol, informou que todo o sistema Guardião Web na SSP/AL está disponível aos delegados de polícia, que têm a total autonomia para designar agentes de sua confiança e que o Sistema Guardião disponível exclusivamente à Polícia Civil não é um sistema ultrapassado, sendo idêntico ao Sistema Guardião Web na parte de interceptações telefônicas. Por fim, argumentou que o sistema é operado por agentes de inteligência, experientes e confiáveis, e defendeu que as operações integradas têm sido de extrema relevância na redução da criminalidade em Alagoas.

Acerca do disque denúncia (181), afirmou que ele é coordenado por uma policial civil, o qual encontra dificuldades no recrutamento de policiais civis para trabalhar no sistema.

A última reunião finalizou com alguns encaminhamentos aos presentes: a SSP/AL deverá encaminhar, no prazo de 30 dias, a relação de operações policiais em que foram efetuadas escutas telefônicas pelo Sistema Guardião Web, dos últimos dois anos; e encaminhar as estatísticas que apontam a redução da macrocriminalidade no Estado de Alagoas nos últimos dois anos.

Recomendação – O Ministério Público Federal em Alagoas enviou recomendação ao Secretário de Segurança Pública do Estado, coronel Paulo Domingos de Araújo Lima Júnior, para que o órgão fizesse cessar a operacionalização de interceptação de ligações telefônicas por meio de órgãos estranhos à estrutura da Polícia Judiciária e do Ministério Público.

De acordo com a procuradora da República Niedja Kaspary, autora da recomendação, “a Constituição Federal, a Constituição do Estado de Alagoas, a Lei Federal nº 9.296/96 e as Resoluções nº 59/2008 e 36/2009 do CNJ e do CNMP não respaldam a participação de outro órgão do Poder Executivo distinto da Polícia Civil no manuseio de conversas telefônicas decorrentes de uma investigação criminal, salvo quando expressamente autorizado pelo Poder Judiciário em determinado caso concreto”.

Diante do Noticiado através de representação de que a Assessoria Integrada de Inteligência da SSP executa e manipula as informações advindas de interceptações telefônicas, e que o órgão tem por função assessorar o Secretário de Segurança Pública em tema de gestão estratégica – sendo, portanto, órgão externo à persecução criminal, não possuindo atribuição para a abertura de inquérito policial e o desenvolvimento de investigações visando à repressão de crimes-, o MPF expediu a recomendação para a adequação da SSP às legislações federais e pactos internacionais, sob pena de ajuizamento da devida Ação Civil Pública junto à Justiça Federal.

Para a procuradora da República, as interceptações telefônicas constituem meio de prova invasivo à intimidade de um investigado devendo observar fielmente a legislação em vigor, sob pena de violação de direitos humanos consagrados na Constituição Federal e em Pactos Internacionais.

Competência do MPF – A competência do MPF se afigura por sua atuação na defesa dos direitos humanos e garantia de respeito aos direitos fundamentais dos cidadãos, bem como em face da função de guardião da Constituição Federal, das Convenções Internacionais que o Brasil é signatário, das Leis Federais e demais instrumentos normativos do ordenamento jurídico.

Salientando, ainda, que os equipamentos utilizados pela SSP – Sistema Guardião Web – para executar as interceptações com autorização judicial foram adquiridos com recursos federais, por meio de convênio com o Ministério da Justiça, sendo, pois, dever do MPF garantir que sua destinação seja adequada.

O convênio firmado com o Ministério da Justiça, no ano de 2013, sob o n 787318, possuiu como justificativa, segundo documento apresentado pela SSP ao MPF, entre outras, “as ações estruturantes destinadas a dinamizar os procedimentos que visam a Produção de Conhecimentos estabeleceram a criação de 04 (quatro) Núcleos de Inteligência Avançados de Segurança Pública (NIASP), os quais serão inicialmente estruturados nas sedes das Delegacias Regionais da Polícia Civil nos municípios de Penedo, União dos Palmares, Arapiraca e Delmiro Gouveia, definidas respectivamente como sendo 1a, 2a, 3a, e 4a NIASPs”.

Caso Escher – No ano 2000, o Brasil foi denunciado à Comissão Interamericana de Direitos Humanos por violações ao direito à privacidade e à liberdade de associação, discutindo-se, na ocasião, os limites do exercício do poder público. As vítimas denunciaram ao Organismo Internacional que, entre abril e junho de 1999, a Polícia Militar do Estado do Paraná realizou a interceptação e monitoramento de suas linhas telefônicas e ainda concorreram para a divulgação das conversas telefônicas, bem como que a justiça indeferiu seu pleito e a reparação adequada.

Por fim, o país foi condenado a pagar 100 mil dólares de multa a cinco vítimas, por interceptações de ligações telefônicas que violaram as regras estabelecidas na Lei n. 9.296/96 e pela violação dos artigos 11 (Proteção da Honra e da Dignidade) e 16 (Liberdade de Associação) da Convenção Americana de Direitos Humanos.

Assim, a fim de evitar que o Brasil seja novamente responsabilizado em razão de violação de direitos humanos consagrados em diplomas internacionais e no direito interno (Constituição Federal e legislação ordinária), em âmbito internacional, em face dos compromissos assumidos em tratados internacionais, o MPF recomendou a estrita adequação do órgão estadual à legislação.