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Fapeal viabiliza construção do Banco de Dados da Fala Alagoana

05/03/2016
Fapeal viabiliza construção do Banco de Dados da Fala Alagoana
Pesquisa intitulada “Português alagoano” visa construir um banco de dados de falares a partir de várias regiões do Estado (Fotos: Tárcila Cabral)

Pesquisa intitulada “Português alagoano” visa construir um banco de dados de falares a partir de várias regiões do Estado (Fotos: Tárcila Cabral)

Frequentemente, as pessoas encontram-se desatentas as suas próprias formações linguísticas e não as percebem. O apagamento de algumas sílabas, a nasalização da voz e outros fenômenos são bastante comuns, mas passam despercebidos para quem fala.

A maioria da população não se configura dentro de um mesmo grupo de características, por isso não percebem as próprias expressões e entonações e necessitam ouvir-se para entenderem que fazem parte de um processo e pertencem a um tipo de falante específico.

Partindo deste princípio, o professor doutor em linguística da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), propôs a criação de um projeto que analisasse a linguagem alagoana, focando-se principalmente em sua construção fonológica.

A pesquisa intitulada “Português alagoano” tinha por objetivo construir um banco de dados de falares a partir de várias regiões do Estado, trabalhando os grupos e esta miscigenação distinta que influencia na criação da língua local.

“Analisamos os processos fonológicos que apresentam maior ocorrência em grandes grupos e, a partir daí, formam as características das falas ouvidas em Alagoas. A aluna Caroline, integrante do grupo de estudos, está realizando um TCC específico sobre a sílaba ‘Te’ no Estado. A sílaba pode ser pronunciada como ‘Ti’ ou ‘Tchi’, e ocorre com frequência nas palavras terminadas em T devido ao processo de assimilação linguística que inclui o som “Tch”, como em bicoit(ch)o, oit(ch)o, gost(ch)o. Sendo que este processo não é exclusividade só do alagoano, ele se repete em outras localidades do país”, alega o professor.

Os estudos começaram em 2013, e sua base inicial de dados será concluída e disponibilizada para o público em 2016. Depois de pronto, o banco nunca terá um término, ou estará completo, pois será constituído anualmente por novas pesquisas a partir de outros grupos, visto que a linguagem não é estática, passando por mudanças ou perdas e isso é significativo para a manutenção dos estudos.

As coletas de dados propunham entrevistar pessoas da forma mais natural possível. Elas não percebiam que estavam sendo analisadas, sabiam do estudo, mas o objetivo era tirar o foco das perguntas e quebrar a seriedade. As gravações aconteciam de maneira despretensiosa. Elas sabiam do nome geral do projeto, mas as perguntas abordavam a infância, o período escolar, situações que faziam com que elas fossem levadas ao lado mais emocional e ocorria tudo espontaneamente. Ao todo, 15 cidades foram registradas nas pesquisas e contribuíram com os resultados.

A pesquisa final possuirá várias horas de gravações de diversos moradores de todas as partes de Alagoas. O trabalho inclui 20 subprojetos temáticos da variação linguística do Estado, pois o assunto abrange diversas análises acerca dos tópicos de variação no falar alagoano.

Financiamento – A pesquisa contou com recursos substanciais do CNPq e com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Alagoas (Fapeal). O CNPq viabilizou os investimentos para estruturação do projeto desde o início até a sua conclusão em agosto deste ano. Ao fim do auxílio, o banco de dados estará acessível em número considerável para um acervo digital, funcionando como um museu de sons.

A Fapeal contribuiu com a proposta financiando uma bolsa do projeto no período de um ano. A aluna Robertina Ferreira, a bolsista do estudo, finalizou uma das pesquisas realizadas com este apoio. Robertina analisou especificamente o desaparecimento do “R” no vocabulário local, notando que em muitas palavras esta consoante deixa de ser pronunciada por habitantes da capital.

“O projeto tem uma maior importância, para outras pessoas que desejam levar os estudos adiante. Com a pesquisa, você espera descobrir fatores ainda não descobertos e identificados. Estudando os fenômenos você descobre novas construções e isso é interessante”, explicou Robertina Ferreira.

A bolsista ficou responsável por gravar com um grupo de 30 pessoas, que deveriam ser nascidas ou residir em Maceió por pelo menos 20 anos. A faixa etária necessária para a pesquisa era de 18 a 65 anos, estudando neste caso, questões do apagamento do “R” exclusivamente.

As gravações realizadas no interior abordam as mais diversas características e são feitas por estudantes de mestrado e doutorado em Arapiraca, Delmiro Gouveia e São Miguel dos Milagres. Todo aluno possui um projeto em especial dentro da construção do linguajar alagoano.

Por exemplo, o subprojeto da aluna de doutorado Geyla estuda um aspecto peculiar, o chamado “R” interiorano, mais forte, que foi surpreendentemente encontrado em São Miguel dos Milagres, em um número considerável dos moradores mais antigos, onde, não se tinha dados e nem relatos da ocorrência da pronúncia. É possível encontrar um “R” quase mineiro, ouvindo-se p“ôr”ta, p“ôr”teira, “âr”mário.

Outra aluna, Ana Maria, pesquisa a nasalização em Penedo, Palmeira dos Índios e Santana do Ipanema, onde se nasalizam as vogais em várias palavras do contexto comum, em termos como b“â”nana, t“ô”mate, entre outras.

O projeto continuará sendo constantemente atualizado. O recurso para a pesquisa serviu para estruturar e iniciar a construção de um banco de dados que, após pronto para visualização, contará com um grande acervo crescente, sendo operado por professores e alunos. Os dados iniciais estarão disponíveis no sitewww.portuguesalagoano.com.br, em fase de construção, para quem desejar conhecer o trabalho e conhecer mais sobre a constituição da fala em sua região.

“A pesquisa tem dois tipos de amostra: uma amostra estratificada com jovens, adultos, idosos, homens, mulheres e de duas escolaridades, e outra de forma aleatória com vários alunos pesquisando constituindo um banco de dados. O estudo tem aproximadamente uns 600 informantes no Estado, e vamos caminhar para atingir um banco de dados com 600 a 700 pessoas”, declara Alan Jardel.

Dentro da teoria linguística, toda fala possui características essenciais. E estas singularidades fonológicas sempre sofrerão variação, porém não se altera a forma escrita. É este aspecto que salta aos olhos da pesquisa: a variação da pronúncia e fonologia.

“Um fato que diferencia, por exemplo, a fala alagoana da pernambucana, é que o S no estado vizinho tem som de ‘SH’ como Es(sh)cola, Cus(sh)cuz, e em Alagoas normalmente ela se apresenta aberta no emprego do S. Porém se tivermos um T, D, N e L depois da sílaba ele ficará com som de ‘Sh’, como vemos muito em as ‘Mesas(sh), todas’. Portanto, só se fala esse tipo de ‘Sh’ em Alagoas diante das 4 consoantes exclusivamente T, D, N, L, que não ocorre no uso de outras consoantes e isso difere o alagoano do pernambucano. Em outras palavras não se repete o som, porque as consoantes distintas não estão inclusas no processo chamado de palatização que é mais frequente em Pernambuco do que no aqui no estado, isso difere de forma clara”, cita o professor.

O Banco de Dados da Fala Alagoana quando concluído, será um aparato de dados fixo, aberto e disponível, um museu de sons e de formas de falar. O plano futuro é continuar a ampliação do projeto, incluindo novas cidades ao estudo dos processos fonológicos e analisar as heranças históricas e de constituição dos dizeres locais