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Bitcoin: uma promessa que falhou?

02/03/2016
Bitcoin: uma promessa que falhou?

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Vista por muito como a “moeda do futuro”, o Bitcoin não passa por um de seus momentos mais otimistas. No dia 14 de janeiro, Mike Hearn, um dos principais nomes ligados à criptomoeada, publicou um longo texto no Medium expondo os motivos pelos quais ele acredita que a moeda não tem um futuro saudável pela frente.

Segundo ele, o Bitcoin se tratou de um experimento que falhou em diversos níveis, se tratando de uma solução construída com base em fundações quebradas. “Independente do que acontece com o preço a curto prazo, em longo termo a tendência é de decadência. Eu não vou mais tomar parte no desenvolvimento do Bitcoin e vendi todas as minhas moedas”, afirmou.

Essa não é a primeira vez que alguém decreta a morte da tecnologia, como bem provam as notícias reunidas pelo site 99Bitcoins. Tomando como base publicações feitas por sites importantes como o Washigton Post, a página afirma que tal ocorrência já foi relatada nada menos que 93 vezes até o momento — e, mesmo assim, as transações com a criptomoeda continuam acontecendo, assim como sua mineração.

Problemas na comunidade

Segundo Hearn, um dos maiores “evangelizadores” do Bitcoin, a solução falhou porque sua comunidade de desenvolvedores e usuários fracassou em seu intento. Inicialmente vista como uma solução que dispensava sistemas bancários e que trabalhava de forma descentralizada, a tecnologia acabou concentrada na mão de poucos grupos com muito poder.

“E o pior, a rede está próxima a seu colapso. Os mecanismos que deviam prevenir isso foram quebrados, e o resultado é que não é mais possível pensar no Bitcoin como uma solução melhor do que o mercado financeiro atual”, argumenta.

Segundo ele, a corrente de blocos disponíveis está cheia graças a um limite “temporário” que restringe o tamanho total de um bloco a 1 megabyte — cuja permanência faz com que a rede atual esteja totalmente exaurida. Hearn argumenta que o pico da rede aconteceu em julho de 2015 durante um ataque DDoS chamado de um “teste de stress” por seu perpetuador.

“Nesse nível, cerca de 700 kilbobytes de transações (ou menos de 3 pagamentos por segundo) é provavelmente o limite do que o Bitcoin pode atingir na prática”, afirma o desenvolvedor. Segundo ele, muito disso é resultado da formação de grandes grupos chineses especializados em minerar a moeda que, atualmente, têm controle sobre seu valor e provocam problemas na rede graças ao “Grande Firewall Chinês”.

Isso provoca lentidões em todo o sistema, fazendo com que tudo aja como a conexão de um hotel que não oferece um WiFi de boa qualidade. Ao concentrar mais de 50% da capacidade de mineração de novos blocos, a China adquiriu um ponto de vantagem estratégico que desequilibra todo o sistema.

Guerra civil

Outro problema relacionado ao limite de transações permitidas pelo sistema está no fato de que muitas delas ocorrem em ritmo imprevisível. Para completar, soluções como a criação de um “botão” que reverte transações gera desconfianças entre fornecedores de serviços, que perdem a certeza que vão ser recompensados por seus esforços.

Para completar, o Bitcoin chegou ao ponto em que congestionamentos em sua rede podem fazer com que as taxas cobradas excedem as de um cartão de crédito, por exemplo — para tentar melhorar o tráfego, o sistema aumenta automaticamente o valor da moeda sempre que ocorrem muitas transações simultâneas. Com isso, o que parecia ser uma alternativa livre e rápida ao sistema econômico atual parece somente uma alternativa desvantajosa que não traz nenhuma das poucas seguranças oferecidas pelas instituições bancárias tradicionais.

Outra crítica de Hearn é quanto à “guerra civil” que os desenvolvedores dedicados à tecnologia estão travando no momento. Muitos dos envolvidos estão censurando debates e atacando servidores de outras pessoas, sendo que muitos discordam das ações dos cinco membros do Star Chamber, uma espécie de comitê que dita o futuro da moeda.

O desenvolvedor afirma que muitos dos responsáveis pelos rumos da criptomoeda estão impedindo sua popularização por temer que isso vá acabar com os lucros certos que ela gera atualmente para uma comunidade bastante restrita. “Afinal de contas, por que a comunidade que defendeu a corrente de blocos como o futuro das finanças iria matá-la de forma deliberada ao estrangular a corrente em seu berço? Porque é exatamente isso que está acontecendo”.

Segundo Hearn, a discussão relacionada ao aumento da capacidade da corrente de blocos já gerou vítimas, especialmente entre aqueles que defendem sua ampliação. Entre elas está a Coinbase, a mais conhecida e maior startup do Bitcoin nos Estados Unidos, que foi apagada do site oficial da solução e banida de seus fóruns de comunidade por escolher o “lado errado”.

Falta de informações

Outro ponto que pode ter condenado o futuro da criptomoeda é o “apagão” de informações oferecidas aos fornecedores ocorrido em 2015. Originalmente aberta, a comunidade de desenvolvedores está cercada de mistérios e decisões que dificilmente vêm a público, o que diminui a confiança de investidores e a viabilidade da tecnologia.

“É algo complexo, mas isso nunca me preocupou porque todas as informações de que um investidor precisava estavam lá e havia toda uma indústria de livros, conferências, vídeos e sites para ajudar as pessoas a entender tudo isso. Isso agora mudou”, afirma Hearn.

O desenvolvedor afirma que o lançamento do Bitcoin XT, ferramenta que permitia que a comunidade de usuários votasse em mudanças no sistema, foi essencial para essa mudança na postura da comunidade. Segundo ele, um grupo pequeno de pessoas poderosas — entre elas, um administrador do bitcoin.org que permitia a discussão de atividades criminosas dentro de seus fóruns —, que afirmavam que a solução não representava um consenso e deveria ser considerada uma “abominação”.

Com isso, as menções ao Bitcoin XT foram eliminadas de salas de discussão e todos aqueles que faziam referência à solução eram banidos. Apesar de essas pessoas conseguirem se reunir em novos fóruns, um número massivo de pessoas se tornou incapaz de acompanhar notícias sobre o mercado de um dia para outro.

“Pela primeira vez, investidores não tem uma forma clara de descobrir o que estava acontecendo. Visões dissidentes estavam sendo sistematicamente suprimidas. Críticas técnicas do que o Bitcoin Core estava fazendo eram banidas, com coisas sem sentido sendo colocadas em seu lugar. E é claro que muitas pessoas que entraram casualmente nesse mercado durante um de seus ciclos de hype não têm ideia do que é o sistema e quais seus limites artificiais”.

O Bitcoin está condenado?

O texto de Hearn também discorre sobre algumas questões políticas e como aqueles que controlam o código do Bitcoin chegaram à conclusão de que era preciso limitar sua abrangência. Sua conclusão é a de que a ganância e a falta de visão de algumas pessoas condenaram todo o sistema, que nunca vai atingir os objetivos que foram atribuídos a ele em sua criação.

Apesar de o futuro da plataforma ainda não estar determinado, fato é que a saída do desenvolvedor de sua comunidade de apoiadores não é nada positiva. Caso as acusações feitas por ele sejam verdadeiras, a moeda virtual considerada como uma alternativa para o sistema financeiro global pode estar condenada — ao menos no que diz respeito à sua popularização entre usuários “comuns”.