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Na função de advogado

10/02/2016
Na função de advogado

Exatamente no mês de dezembro de 2015, completei 35 anos de exercício pleno na Advocacia. Durante esses anos de militância na defesa das minhas prerrogativas como advogado fui vítima de perseguições, abusos e violações, as quais suportei com dignidade e altivez, uma vez que o trabalho de Advogado é, por sua natureza, um serviço combativo. Mas, nunca me acanhei em afrontar autoritarismo e arbitrariedade em busca da proteção dos meus direitos e do direito dos meus clientes, em correta aplicação da ordem jurídica vigente no país.

Iniciei minha advocacia no ano de 1980, antes da promulgação da Nova Constituição Federal de 1988 e antes da aprovação e sanção do Novo Estatuto da Advocacia de 1994. Por tais razões tive que enfrentar dificuldades no exercício desse “múnus público”. Como advogado militante sofri retaliações, indiferenças, abusos e embaraços na minha profissão, muitas vezes, por iniciativas de Delegados de Polícia, de Juízes, de Promotores de Justiça e de outros agentes públicos do Estado, que deveriam zelar pela observância da lei e pela aplicação das normas constitucionais e jurídicas da nação.

Foi muito constrangedor para eu fazer valer os meus direitos e as minhas prerrogativas na Advocacia, mesmo tendo a consciência de que a minha profissão era e ainda é indispensável à administração da Justiça. Anonimamente combati e lutei, sem recorrer à Ordem dos Advogados do Brasil, para garantir a inviolabilidade do meu Escritório Jurídico e dos meus próprios atos e manifestações no exercício desta profissão milenar.

Defendi insistentemente minhas defesas e pareceres no sentido de que os Honorários Advocatícios se tratavam de remuneração do serviço prestado pelo Advogado e, portanto, reconhecida como verba de natureza alimentar. Por vezes, discuti com autoridades de que quando o Advogado não advoga de forma gratuita (e isso eu fiz durante anos), deve-se remunerar sua atuação profissional. E tanto isso é verdade como causa justa que, em recente aprovação da Súmula Vinculante nº 47 do Supremo Tribunal Federal, ficou respaldado pelo texto constitucional, que os honorários advocatícios, sucumbenciais ou contratuais, consubstanciam verba de natureza alimentar em favor deste profissional do Direito.

E não é lá só isso! Durante meus 35 anos de advocacia plena  e irrestrita, tive sempre o cuidado de fazer valer o reconhecimento do meu ministério privado como prestação de um serviço público, exercendo como indispensável função social na defesa das leis vigentes, dos direitos humanos e da paz pública, bem como na proteção dos interesses dos meus clientes em juízo e fora dele. E tudo isso fiz, e ainda continuo fazendo, com a altivez, coragem e independência que são inerentes à profissão de advogado.

Nesses tempos de labuta e de sobrevivência nunca me curvei com submissão diante de autoridades arbitrárias ou frustradas. Antes, porém, tratei e ainda trato todas elas com consideração e respeito, desde que as mesmas não extrapolem seus direitos e prerrogativas. Aliás, entre Advogados, Juízes, Delegados de Polícia, Procuradores de Estado, Serventuários e Promotores de Justiça, não há hierarquia nem subordinação, devendo todos se relacionar com urbanismo e tratamento compatível com a dignidade de cada função e nas condições adequadas a cada desempenho funcional.

Durante meus 35 anos na advocacia presenciei juiz, escondido por trás de um biombo, comendo “chocolate” para não compartilhar o “lanche” com serventuários ou advogados presentes ao seu gabinete; presenciei juiz assediando mulher casada, no intervalo de audiência; vi delegado de polícia recebendo “propina” de advogado para liberar preso acusado de crime afiançável; presenciei escrivão “engavetando” processo a pedido de advogado para resultar em decadência de direito em detrimento da vítima. Vi e ouvi muito mais que isso!

No entanto, aqui e agora relembro momentos imemoráveis convividos com juízes, desembargadores, ministros, promotores, serventuários, delegados e advogados, com os quais convivi e que, mesmo após suas transições para a Jerusalém Celeste, ainda me fazem emocionar pela dignidade de caráter e pelo senso de Justiça, sobre os quais mantenho eterna saudade… Por fim, parafraseando o poeta português Fernando Pessoa: “Tudo vale a pena, se a alma não é pequena”… Pensemos nisso! Por hoje é só.