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“Quem vende voto está pecando tanto quanto quem compra”, alerta Dom Dulcênio

29/08/2014
“Quem vende voto está pecando tanto quanto quem compra”, alerta Dom Dulcênio
Foto: Tribuna do Sertão

Foto: Tribuna do Sertão

Dom Dulcênio Fontes de Matos é Bispo da Diocese de Palmeira dos Índios. Concedeu entrevista exclusiva ao jornal Tribuna do Sertão onde abordou várias temáticas, entre elas, a importância das ações sociais desenvolvidas pela Diocese em seus 36 municípios. O bom desenvolvimento do campo missionário e religioso da Diocese, citando na oportunidade, a Pastoral da Família, que está entrando nas paróquias com o intuito de ajudar as famílias, ensinando os valores cristãos; Os grupos jovens evangelizados, a Pastoral da Criança, que inclusive ganha destaque, pois, vem se desenvolvendo em números relevantes considerando a proporcionalidade com o resto do País.

Além disso, Dom Dulcênio afirmou que o Papa Francisco pede que os Bispos, padres não fiquem apenas numa igreja de sacristia, que todos devem sair e ir até as periferias conhecer a realidade das pessoas mais carentes em suas comunidades, e o mesmo garante que a Diocese de Palmeira está desenvolvendo essa nova forma de evangelizar, saindo mais das igrejas e indo ao encontro dos fieis por meio dos projetos desenvolvidos.

Devido ao período de eleições no País, Dom Dulcêncio também fez uma alerta com relação a escolha dos candidatos, afirmando que é necessário realizar uma “busca” procurando obter informações a respeito da atuação daqueles que já exerceram cargos políticos e conhecer melhor os que estão se candidatando pela primeira vez. Por fim, o Bispo finaliza dizendo que: “Não temos direito de vender nosso voto. Pois, voto não tem preço, tem consequência”, declarou Dom Dulcênio.

 Confira abaixo a entrevista na íntegra:

Tribuna do Sertão – Como está sendo desenvolvido os trabalhos na Diocese de Palmeira dos Índios?.

Dom Dulcênio – Os trabalhos realizados pela Diocese de Palmeira dos Índios é muito grande e vem desenvolvendo os projetos nos 36 municípios de Alagoas que fazem parte da Diocese. Podemos citar como exemplo, a Pastoral da família, Cárita Diocesana, a Pastoral do jovem rural, o Movimento dos Homens do Terço; a Casa do Menor em Santana do Ipanema, as creches em Pão de Açúcar, Batalha e aqui em Palmeira dos índios, A Fazenda da Esperança em Poço das Trincheiras. E tudo isso faz parte do trabalho social da Diocese.

Porém, queremos destacar que cada paróquia faz a sua parte com seus trabalhos sociais e que não se limita nas ações da Diocese. Por exemplo, aqui mesmo na sede nos temos o trabalho que é a Vila do Idoso, que está sob a responsabilidade da Diocese e atualmente nós temos cerca de 40 idosos, e esse trabalho te sido referência para o Estado de Alagoas.

É bom destacar que todo esse trabalho social é feito em conjunto com a questão religiosa. Pois, na minha opinião, o religioso não pode estar separado do social, ou seja, distinguindo que uma parte é de Deus e a outra é do mundo. Eu acredito que viver o evangelho, é viver a palavra, é transformar as coisas em vida, e vida é justamente tudo isso que nós fazemos além da palavra que transforma, também os gestos concretos. O nosso objetivo é evangelizar sim, e isso no sentido mais completo da palavra. É salvar o homem como um todo.

Tribuna do Sertão – Pode-se afirmar que a igreja, em especial, a Diocese de Palmeira, hoje está cada vez mais próxima dos seus fieis devido a esses trabalhos sociais que permite o conhecimento da realidade de cada população?

Dom Dulcênio – Isso é exatamente o que o Papa Francisco tem solicitado aos Bispos, aos Padres e aos homens e mulheres de boa vontade, que não fiquemos apenas numa igreja de sacristia, que devemos sair e ir até as periferias conhecer a realidade dessas pessoas mais carentes. Então, essa é a nossa preocupação, que é servir a Deus, mas sem desprezar esse outro lado que é o ser humano. Pois, não adianta estar na igreja e dizer que ama a Deus e saber que um irmão está passando fome.

Temos que evangelizar mostrando que o nosso Deus está muito presente e nós podemos ser usados com instrumentos para fazer o bem. Antes que as pessoas possam indagar: que Deus é esse que nos deixa passar fome?. Dom Jaime durante a campanha conta a miséria e a fome no Brasil, disse que não entendia com um país que é na sua grande maioria cristão, ainda hajam pessoas passando fome, porque isso é a maior contradição do evangelho. E atualmente dados apontam que ainda existem 57 milhões de brasileiros passando fome em nosso País, apesar de todos esses projetos sociais dos governos federal, estadual e municipal, esse número alarmante de pessoas passam fome, e vivem com a falta de moradia, educação e, como estamos vendo por meios dos veículos de comunicação, passando também por um verdadeiro caos na saúde pública do Brasil.

Tribuna do Sertão – Diante de todos esses problemas citados anteriormente, como a fome, a falta de moradia, educação e assistência médica, qual seria o conselho a ser dado?.

Dom Dulcênio – Então, o que nós estamos fazendo diante dessa grandiosidade de necessidades alguns podem até considerar que seja muito pouco, mas nós estamos fazendo. E eu penso que não podemos ficar de braços cruzados apenas reclamando da situação. Devemos tomar a frente de algumas coisas e tentar fazer, dentro das nossas possibilidades, alguma coisa que possa ajudar ao próximo. Veja bem, só em um projeto do cáritas que nós estamos fazendo, são 333 famílias beneficiadas com as cisternas, esse é apenas um dos vários projetos que temos e um exemplo para se dado.

Tribuna do Sertão – Existe alguma parceria, apoio com os quais a Diocese conta para executar os projetos?.

Dom Dulcênio – Sim. Mas antes de falar nessas parcerias gostaríamos de explicar que a igreja não tem nenhuma vantagem financeira com esses projetos. Não recebemos um centavo dessas ações sociais. Contudo, devemos destacar as parcerias, já que seria impossível desenvolver esses trabalhos sem o apoio dado, pois nós não temos recursos, os recursos só chegam por meio dos parceiros. E podemos citar com exemplo o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, do Governo Federal (no projeto das cisternas de água – Cáritas) governos estadual e municipal, por meio dos programas, e também de todas as equipes que são voluntárias nesses projetos. Claro que existem alguns profissionais que são pagos com os recursos que vêm para o próprio projeto.

Não esquecendo dos “ leigos” da igreja, (termo usado para as pessoas que estão na igreja ajudando nesses trabalhos mas não são religiosos como os Bispos, padres) que ajudam de forma sem igual, além dos voluntários. Um fato que pode ser colocado como exemplo foi quando aconteceu a enchente em Quebrangulo, que foi uma tragédia, e eles nos ajudaram de forma sem igual. Fomos ao rádio solicitar ajuda a população e em menos de duas horas nós conseguimos arrecadar vários quilos de alimentos que lotou um caminhão.

A igreja Matriz ficou por quase 5 meses servindo como local para arrecadação e repleta de alimentos, roupas, agasalhos, enfim, produtos doados que foram distribuídos para as famílias atingidas. Então, realizar ações sociais é isso, saber das necessidades das pessoas, buscar ajudá-las, tentando seguir os ensinamentos de Cristo. Lembrando que evangelizar não é só rezar, é também fazer o bem ao próximo, sem querer nada em troca.

Tribuna do Sertão – Várias políticas sociais são desenvolvidas também pelos governos, empresários e outras instituições. No entanto, existem alguns que as enxergam de forma negativa por fazer com que a população fique dependente das mesmas e resulte em “troca de favores”. Como a igreja se diferencia nessa questão?.

Dom Dulcênio – Queremos deixar bem claro que, nós não estamos fazendo esses trabalhos como fazem alguns políticos, que é esperando algum retorno. E esse retorno esperado é sempre através do voto. A situação é completamente diferente da nossa, pois nós realizamos essas ações simplesmente por amor e sempre no anonimato. Então, aí está a grande diferença das ações sociais desenvolvidas pela igreja. Não esperamos nada em troca porque o nosso objetivo é ajudar as pessoas indistintamente.

A nossa maior alegria e recompensa é quando chegamos, por exemplo, nesses locais onde acontecem as ações e podemos perceber que aquelas famílias que antes passavam necessidades estão em situações melhores, e têm hoje o alimento para matar sua fome e a água para saciar sua sede. Quando voltamos aos locais percebemos a alegria e a paz naqueles lares.

Tribuna do Sertão – Em uma revista da Diocese V. Ex.ª Revma faz uma alerta para a população devido ao período das eleições. Foi destacando inclusive a responsabilidade de suas escolhas. Poderia fazer alguma explanação sobre o assunto?.

Dom Dulcênio – É verdade, fiz realmente um texto onde abordei o assunto justamente por querer fazer uma alerta para a população durante esse período, afirmando que, mais uma vez estamos diante de uma difícil tarefa de escalar o nosso “time”, (fazendo nesse caso uma breve alusão à seleção brasileira de futebol), só que agora a seleção de nossos representantes será nos âmbitos estadual e federal. E essa é agora a nossa grande responsabilidade, sobretudo, no que diz respeito à atuação dos nossos candidatos.

É preciso que fiquemos atentos ao que eles pregam e ao que eles já andaram fazendo ao longo de sua vida pública. Alguns que agora se apresentam preocupados com o bem comum, “religiosos”, sérios, honestos, podem até já ter se envolvido em algum esquema de corrupção ou da compra de votos. Por isso, para não nos enganarmos, devemos fazer uma revisão histórica, procurando obter informações a respeito da atuação daqueles que já exerceram cargos públicos e procurar conhecer os que estão se candidatando pela primeira vez.

“Política não se faz com barganhas, mas com ideias claras e objetivos que visam o bem comum e a dignidade das pessoas. Por isso, não façamos de nosso voto uma mercadoria, nem dos nossos candidatos mercadores. Voto não tem preço, tem consequência. Quem vende seu voto está pecando tanto quanto quem compra”, finaliza.