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Ministério Público propõe nova ação civil contra a ALE por desrespeito à LRF

19/12/2013
Ministério Público propõe nova ação  civil contra a ALE por desrespeito à LRF
Procurador Sérgio Jucá

Procurador Sérgio Jucá

Os Ministérios Públicos Estadual e de Contas propuseram, na manhã desta quinta-feira (19), uma nova ação civil pública (ACP) contra a Assembleia Legislativa de Alagoas e a presidência daquele Parlamento. Desta vez, a Casa de Tavares Bastos está sendo acusada de infringir a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e efetuar despesas relativas a folha de pessoal acima do limite legal que é de, no máximo, 3%. O dano já ultrapassa as cifras dos R$ 33 milhões e, para revertê-lo, os MPs querem que o Legislativo exonere servidores e seja impedido de conceder gratificações. Esta é a segunda ação principal movida pelos MPs contra o Poder Legislativo estadual em apenas uma semana e é fruto do trabalho integrado entre o procurador-geral de Justiça, Sérgio Jucá, os demais 14 promotores de Justiça que compõem o grupo designado para investigar fraudes na folha de pagamento da ALE/AL, o procurador-geral do MP de Contas, Pedro Barbosa Neto, e os procuradores do MP de Contas. Desde o dia 31 de outubro último, depois da propositura de uma ação cautelar que pediu o afastamento da então Mesa, a Justiça determinou que Fernando Toledo (PSDB), Antonio Albuquerque (PRTB), Sérgio Toledo (PDT), Jota Cavalcante (PDT), Maurício Tavares (PTB), Marcelo Victor (PTB), Marcos Barbosa (PPS) e Dudu Hollanda (PSD) não podem mais administrar a Assembleia até o início de 2014.
Na ação proposta hoje, os Ministérios Públicos argumentaram que a Assembleia Legislativa, ‘em flagrante inconstitucionalidade’, violou a LRF para majorar o limite da despesa com pessoal do Legislativo alagoano para 4,0% da Receita Corrente Líquida (RCL), com a seguinte divisão: 3,0% para o Parlamento e 1,0% para o Tribunal de Contas do Estado de Alagoas. Todavia, essa alteração, que foi aprovada através do artigo 52 da Lei Estadual nº 7.405/2012 (Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2013), encontra-se em total desacordo com a Constituição Federal e a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.
No que diz respeito ao limite legal da despesa com pessoal, o artigo 169 da Constituição preconiza que esse tipo de gasto com funcionários ativos e inativos da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios não poderá exceder os limites estabelecidos em lei complementar. A lei complementar referida pelo Constituinte é a Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar nº 101/2000), que, em seus artigos 18, 19 e 20, fixou os tetos de cada ente da Federação e de seus órgãos autônomos. E, com relação ao Poder Legislativo Estadual, o artigo 20, inciso II, alínea “a”, da LRF estabeleceu que o limite de pagamento de folha, incluindo o Tribunal de Contas do Estado, é de 3% da Receita Corrente Líquida (RCL), sendo dividido de modo a caber 1,0% ao TCE e 2,0% à Assembleia Legislativa.
Entretanto, mesmo tendo conhecimento dos limites legais, a ALE/AL aprovou a LDO e a Lei Orçamentária Anual para o exercício financeiro de 2013 com previsões de gastos acima daquele teto permitido. Inclusive, o governo do Estado, percebendo a ilegalidade, chegou a vetar o artigo 52 da Lei de Diretrizes Orçamentárias por “vício de inconstitucionalidade e por contrariar o interesse público”. Mas, ainda assim, a Casa de Tavares Bastos rejeitou o veto governamental e promulgou o referido dispositivo.
“A LRF estabelece que a Assembleia Legislativa deverá observar o limite máximo de 2,0% para despesa com pessoal. Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal, em controle concentrado, ratificou a sua constitucionalidade. Além disso, é importante esclarecer que a distribuição dos limites percentuais somente pode ser feita por lei complementar federal, como de fato ocorreu. Não se pode admitir, por inexistência de fundamento de validade jurídica, que a distribuição desses tetos seja procedida por lei ordinária estadual. Uma lei ordinária estadual não pode ir de encontro a uma lei complementar federal, cuja constitucionalidade foi confirmada pelo próprio STF. Portanto, diante do que ficou constatado, a Assembleia está realizando gastos públicos superiores ao permitido pelo sistema jurídico em vigor e, assim, vem lesando os cofres do Estado de Alagoas”, explicou Sérgio Jucá, procurador-geral de Justiça.

Os limites ultrapassados
No exercício financeiro de 2013, a Assembleia Legislativa de Alagoas publicou os Relatórios de Gestão Fiscal, conforme exigência da LRF, relativos ao 1º e 2º quadrimestres, nas edições do Diário Oficial do Estado dos dias 23 de maio e 25 de setembro deste ano. Através deles, restou comprovado que aquele Parlamento ultrapassou o seu limite de despesa com pessoal em quase R$ 34 milhões.
Pelas cifras que constam nos relatórios, as despesas com folha de pagamento nos primeiros quadrimestres foram de 2,68% e 2,63% da RCL, ou seja, no primeiro quadrimestre o débito com pessoal ultrapassou o limite legal em 0,68% e, no segundo, extrapolou novamente o teto da LRF em 0,63%. Em valores monetários, o Legislativo gastou indevidamente com despesa de pessoal a quantia de R$ R$ 33.819.680,83 (trinta e três milhões, oitocentos e dezenove mil e seiscentos e oitenta reais e oitenta e três centavos) nos últimos 12 meses que englobam o quadrimestre, em ambos os casos.
“Trata-se de gasto ilegal de recursos públicos, na ordem de quase R$ 34 milhões de reais num Estado carente de políticas públicas e que ostenta um dos piores níveis de desenvolvimento econômico e social do Brasil”, declarou José Carlos Castro, coordenador do Núcleo de Defesa do Patrimônio Público do MPE/AL.
“Essa é uma despesa ilegal que precisa ser reduzida nos próximos dois quadrimestres por imposição da LRF. O que ocorre na Assembleia não é apenas um descumprimento ao texto constitucional e a Lei de Responsabilidade Fiscal. Além da despesa excessiva, os MPs observaram que parte desse dinheiro está tendo destinação escusa, a exemplo do pagamento irregular, nos últimos 12 meses, de, pelo menos, cerca de R$ 3,5 milhões exclusivamente para servidores comissionados com salários acima do teto constitucional”, explicou o procurador de Contas Rafael Alcântara.
“O objetivo principal dessa ação é impor à Assembleia o freio no descontrole com gastos de pessoal. Faz-se necessário estancar essa sangria com os recursos públicos. Portanto, ao invés de buscar suplementação para pagar a folha, a Mesa Diretora tem a obrigação legal de reduzir esse tipo de despesa, devendo eliminar o excesso com a extinção, primeiramente, de cargos comissionados e de gratificações, como a GDE (Gratificação por Dedicação Exclusiva)”, complementou o procurador.
“Com efeito, caso a ALE/AL não volte a respeitar o limite legal de sua despesa com pessoal, o estado de Alagoas, enquanto perdurar o excesso, poderá não mais receber transferências voluntárias, obter garantia, direta ou indireta de outro ente e contratar operações de crédito, ressalvadas as destinadas ao refinanciamento da dívida mobiliária e as que visem à redução das despesas com pessoal. Essa situação de desajuste fiscal da Assembleia é de sobremaneira grave e preocupante para a sociedade e o Estado. Além de provocar uma possível perda de futuros investimentos públicos e privados, ela coloca em risco a celebração e a continuidade dos convênios entre o Poder Executivo e outros entes federados nas mais diversas áreas, especialmente com a União”, alertou Alfredo Gaspar de Mendonça, coordenador do Grupo Estadual de Combate às Organizações Criminosas (Gecoc) do MPE/AL.

A malversação do dinheiro público

Longe de se restringir a um mero ilícito administrativo-fiscal ou simples descumprimento de uma regra de Direito Financeiro, o excesso ilegal da despesa com pessoal da ALE/AL tem servido como mecanismo de fomento à malversação de recursos públicos com a prática de diversos atos de improbidade administrativa – que serão objetos de ações futuras –, que já puderam ter fortes indícios detectados, como pagamentos a servidores além do teto constitucional, pagamentos a funcionários além do limite legal do cargo e pagamentos indevidos de gratificações a cargos comissionados, o que resultou em graves danos ao erário.
Na Nota Técnica nº 2673/2013, elaborada pela Controladoria Geral da União, a instituição apontou veementes indícios da prática de diversas irregularidades no tocante a má gestão de recursos públicos a partir de gastos excessivos e ilegais com despesa de pessoal, dentre as quais se pode destacar o pagamento de R$ 7.096.620,94 (sete milhões, noventa e seis mil, seiscentos e vinte reais, noventa e quatro centavos) a 66 servidores membros de famílias que receberam benefícios do programa Bolsa Família; pagamento de R$ 2.951.678,29 (dois milhões, novecentos e cinquenta e um mil, seiscentos e setenta e oito reais, e vinte nove centavos) a funcionários que constam como aposentados por invalidez no Sistema de Benefícios da Previdência Social – SISBEN; pagamento de R$ 292.996,92 (duzentos e noventa e dois mil, novecentos e noventa e seis reais, e noventa e dois centavos) a servidores constante do Sistema de Óbitos (SISOB), além de diversos pagamentos para funcionários com endereços em outros estados da Federação.
“Além de constituir desequilíbrio e má gestão fiscal, o descumprimento do limite legal da despesa com pessoal por parte da Assembleia, de acordo com informações oficiais dos cadastros da União, vem propiciando terreno fértil para o desvio e apropriação indébita de recursos públicos por meio de supostos servidores daquela Casa, que também figuram como pessoas economicamente hipossuficientes, inválidas, mortas e que até moram fora de Alagoas”, explicou o promotor de Justiça José Carlos Castro.
“Nesse contexto, a recondução da despesa com pessoal da ALE/AL aos ditames da Lei de Responsabilidade Fiscal é medida que se impõe não só porque visa assegurar uma gestão fiscal equilibrada, próspera e responsável, mas também tem o condão de mitigar e inibir a malversação de recursos públicos decorrente de gastos com pessoal ilegais e antieconômicos”, destacou o procurador-geral, Sérgio Jucá.

Impossibilidade de suplementação

O Ministério Público quer impedir que o governo do Estado conceda à Assembleia o crédito suplementar solicitado ao Poder Executivo. “O aumento da despesa com pessoal da ALE/AL por meio da abertura de crédito suplementar, nesse momento, contrariaria o artigo 169, §3º, inciso I, da Constituição Federal e o artigo 23 da LRF, que impõe drásticas medidas para que o excesso dos gastos com pessoal se adequem ao limite estabelecido em lei. Em última análise, a vedação da abertura de crédito suplementar da despesa com pessoal daquela Casa é pressuposto lógico para que se obtenha a redução imposta no regamento jurídico. Do contrário, poder-se-ia criar uma situação materialmente inconciliável de se determinar a redução da despesa com pessoal e, de outro lado, permitir o seu aumento com a abertura de crédito suplementar”, argumentaram os MPs na ação.

E como a concessão de abertura de crédito é uma prerrogativa do chefe do Poder Executivo, está justificada a necessidade do governador do Estado figurar no polo passivo da ação no que se refere à pretensão ministerial de estabelecer a obrigação de não-fazer consistente na vedação de abertura de crédito suplementar para aumentar a despesa com pessoal da Casa de Tavares Bastos. “Eis o motivo, portanto, que atrai o governador a figurar na presente ação como litisconsorte passivo para que se abstenha de efetuar tal concessão de crédito no exercício financeiro de 2013”, explica outro trecho da ACP.

Os pedidos dos MPs à Justiça
Os MPs requereram à Justiça que seja concedida antecipação de tutela com a finalidade de impor obrigação de fazer à ALE/AL no tocante à exoneração de servidores comissionados e dispensa de função gratificada. Essa primeira medida deverá implicar na redução imediata de aproximadamente 20% das despesas da Assembleia Legislativa do Estado de Alagoas. Tal diminuição também deverá ocorrer com o fim da concessão de vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração a qualquer título, salvo os derivados de sentença judicial ou de determinação legal; com a não criação de cargo, emprego ou função; através da proibição de alteração de estrutura de carreira que implique aumento de despesa; sem o provimento de cargo público, admissão ou contratação de pessoal e ainda por meio do fim da contratação de hora extra.
Os MPs também pediram que seja declarada a inconstitucionalidade do artigo 52 da Lei Estadual nº 7.405/2012 (LDO/AL/2013) e a imposição de obrigação de não-fazer para o chefe do Poder Executivo estadual, que consiste na abstenção do governador em efetuar a abertura de crédito adicional suplementar da despesa com pessoal da ALE/AL, no exercício financeiro de 2013.
A petição foi assinada pelos dois chefes dos MPs, o procurador-geral de Justiça, Sérgio Jucá, e Pedro Barbosa Neto, procurador-geral do MP de Contas. Pelos Núcleos de Defesa do Patrimônio Público dos 1º e 2º Centros de Apoio Operacional (CAO), subscreveram os promotores José Carlos Silva Castro, Napoleão José Calheiros Correia de Melo Amaral Franco, Tácito Yuri de Melo Barros e Jorge Luiz Bezerra da Silva. Pelo Grupo Estadual de Combate às Organizações Criminosas (Gecoc), os promotores de Justiça Alfredo Gaspar de Mendonça Neto, Luiz Tenório Oliveira de Almeida, Elísio da Silva Maia Júnior, Antônio Luis dos Santos Filho e Hamilton Carneiro Júnior. Já pela Promotoria de Justiça da Fazenda Pública Estadual assinaram George Sarmento Lins Júnior e Jamyl Gonçalves Barbosa. Os promotores Maurício André Barros Pitta, Marluce Falcão de Oliveira e Givaldo Barros Lessa completam o conjunto de membros que subscreveram a ação civil pública.
Igualmente assinaram o documento os procuradores do Ministério Público de Contas Rafael Rodrigues de Alcântara, Ricardo Schneider Rodrigues, Enio Andrade Pimenta, Stella de Barros Lima Méro Cavalcante e Rodrigo Siqueira Cavalcante.